artigo publicado no jornal O estado do Maranhão
A melhor cena do carnaval que passou foi a da vitória da Unidos de Tatuapé com um samba enredo que homenageou o Maranhão. Outras, menos deslumbrantes, aconteceram também.
1.Folião, sujo e despenteado com cara de bêbado é pego numa blitz. O soldado que aparenta a patente mais alta se aproxima
-Você bebeu? – pergunta o oficial.
-Acho que sim – responde o folião.
-Acha que sim, ou tem certeza? Guarda Luiza, bafômetro nele! – dirige-se o oficial à policial.
Alguns minutos se passam até que a policial Luiza execute o teste.
-Sargento, o teste deu negativo.
– Como assim?
– Isso mesmo. O bafômetro não acusa teor de álcool.
O sargento, irritado se vira para o motorista folião.
– Seu mentiroso! Qual é a sua? Por que disse que tinha bebido?
– Não sou mentiroso. Claro que bebi: água e refrigerante.
– Entendi. Quis se fazer de engraçadinho e me fazer de palhaço, certo? A partir de agora está preso por desacato à autoridade e vai ser multado. Guarda Luiza, você é testemunha.
– Como?? Mas, sargento…
O sargento a chama de lado e sussurra em seus ouvidos, peremptoriamente.
– Para todos os efeitos ele nos destratou. E depois…Como você já deve ter aprendido, neste departamento quanto mais se multa mais se ganha . Fica na tua, Luiza, vai por mim: precisamos de grana pra brincar o resto do Carnaval que ninguém é de ferro.
2.Grupo de amigos se diverte contemplando o desfile de blocos. Há turistas no grupo. O de chapéu, paulista, pergunta para o amigo maranhense.
– Que bloco é esse?
– O dos Foliões. É um dos mais autênticos e famosos da Ilha.
– E essas fantasias parecendo bumba-boi? São típicas, não?
– Talvez. Estão homenageando o Bumba-Boi de Parintins, seus grupos Caprichoso e Garantido, que você já deve ter visto, na Globo.
– Mas, por quê ir tão longe para homenagear?
– Huuumm…Confesso que também não entendi direito.
– Pelo que li – e você sabe que gosto desse assunto-, esse Boi de Parintins seria um arremedo do bumba-boi maranhense, não? Enfim, uma imitação desvirtuada do autêntico folclore de bumba-boi que é o maranhense. Não seria mais justo que se homenageassem aqui os grupos de bumba-boi desta terra? Esses desfiles de Parintins sempre me pareceram mais com um carnaval fora de época.
– É, de fato, mas…
– Por acaso já homenagearam por lá o legítimo bumba-boi, que é o do Maranhão? Por acaso, em alguma ocasião se lembraram de homenagear esta bela Ilha, seus costumes, suas lendas e sua tradição cultural, tão rica, aliás?
– Acho que nunca.
– Desculpe, sou de fora, posso não estar entendendo, mas sempre vi a originalidade e espontaneidade da tradição de vocês, notadamente os bois de matraca, tão plenos da alma popular. Nada da pomposidade carnavalesca e descaracterizada que se vê nos desfiles do bumba boi de Parintins.
– Acho que você tem razão, mas, que fazer? Acontece que por estas bandas sempre foi assim. Só se dá valor ao que vem de fora e nossos divulgadores culturais se submetem a isso como se contaminados por uma submissão doentia e arrevesada. Como diz a sabedoria popular “santo de casa não faz milagres” e os santos daqui além de não fazerem milagres ainda rezam para os de fora, que tiram proveito de nossos bens culturais mais valiosos.
José Ewerton Neto é autor de O entrevistador de lendas