artigo publicado no jornal O estado do maranhão
Jose Ewerton Neto, autor de O entrevistador de lendas
Durante muito tempo se pensou que Oscar Niemeyer fosse o último comunista vivo. Mas, estamos falando de comunista de verdade, daqueles que se dedicam à revolução marxista de corpo e alma e não de copo e alma, como Chico Buarque e outros. Será que ainda existe?
Ei-lo. Lá vai ele, o último comunista. Vai ou vem? Ninguém sabe exatamente. Dizer que é comunista é pouco, mas ao mesmo tempo é tudo, porque é a única coisa que dele se sabe.
Até porque outras coisas não lhe interessam, inclusive o nome, que ninguém sabe qual é. É comunista e pronto. Sabe-se que tem barba, usa óculos, anda com um livro grosso, de capa preta, debaixo do braço, veste roupas longas com calor abrasador e de vez em quando senta na praça sozinho, concentrado em algo indefinido. Usa antigas sandálias tipo franciscano e uma camisa surrada com a imagem de Che Guevara. Uma vez observaram-no na locadora pegando um DVD. Diários da motocicleta, sobre Che Guevara.
Se sua geração, cinquenta anos atrás, já não o entendia direito que dirá esta. Mas, um belo dia, a menina de treze anos, sua vizinha de rua, que anda lendo muito ( para desgosto de seus pais que preferiam vê-la dançando forró ) perguntou para sua mãe.
– Mãe, ele não tem nome?
– Tem sim, comunista.
– Mas, comunista é nome?
A mãe não soube ou não quis explicar. Irritada por ter de explicar coisas que não estavam ao seu alcance a mãe encerrou o assunto, mas a menina não se conformou. Queria porque queria saber o que significa ser comunista. A oportunidade surgiu quando conheceu um jornaleiro amigo do homem. “Também não sei o que significa” disse ele. “Só sei que fala coisas estranhas como: revolução, ideal marxista, ditadura do proletariado, abaixo o imperialismo, paredón! . Sei que vive enfiado nos livros e enrolado numa bandeira vermelha com uma foice. Sei que não acredita em Deus mas ontem o vi rezando pela alma de Fidel Castro. Para que não esbarre com a de Chávez no inferno –explicou.”
A menina seguiu o conselho da mãe e resolveu desistir dessa história mas não conseguiu: só se falava nisso depois da morte de Fidel. Chamou-lhe atenção especial uma frase do compañero do ditador cubano, Che, o que a deixou mais confusa ainda: “Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura, jamais!.” “Ternura?”, pensou ela. “E mandar enfiar balas de fuzil nos corpos de um monte de gente encostada numa parede, lá isso é ternura?”
Quando o viu passar hoje nas ruas, parecendo mais comunista em sua solidão, a menina chegou a sentir pena. Como parece triste!”
Mal sabendo ela que o último comunista não está nada de triste mas obcecado por uma felicidade. Não tira da cabeça a ideia de iniciar uma nova e verdadeira revolução, esta sim vitoriosa para sempre. Sozinho. Já preparou até um litro de Cuba Libre para iniciarem a caminhada. Por enquanto é seu único acólito.