O mundo resolveu acabar em uma quinta-feira, dia do nosso happy hour. É a deixa que o universo fez pra eu tentar chegar na Patrícia. Eu não bebo, mas vou precisar beber pra fazer isso. Ela é filha de um militar reformado alcoólatra alemão e uma carioca. Ou seja, ele bebia na mamadeira, ouvindo Zeca Pagodinho, como canção de ninar. Mas Patrícia é linda, então vale o porre.
– Oi, Patrícia , quanto tempo!
– Fabrício, a gente trabalha junto.
– É, mas lá é um ambiente formal. Aqui as coisas são diferentes.
– Você acha? – disse ela, com certo desdém.
(1×0 pra Patrícia.
Mas o jogo começou agora…)
– Mas é que no ambiente de trabalho, a gente não tem tanto tempo- eu rebato.
– Fabrício, eu te dou carona três vezes por semana , pra você ficar no Pilates.
– Academia.
– Pilates. Todo mundo sabe que você faz Pilates.
– Droga, você contou?
– Você faz pilates mesmo, Fabrício?
– Não, é que… Esquece. Vamos começar de novo.
– Começar o quê?
– O papo. Você não está interessada? Calma. Não precisa responder.
(Merda, 2×0 pra Patrícia. Vou pedir uma bebida. Não bebo, mas isso deve me fazer descolado e relaxado)
– Garçom, um Smoothie, por favor!
(Patrícia me olha, como se eu estivesse pedindo órgãos no mercado negro)
– Quer dizer (com voz mais grossa) Um Smoothie, agora! (Sem “por favor”)
(Patrícia levanta os olhos, como se estivesse me desaprovando. Ela não deve ser o tipo de mulher que acha legal ser mal educado -ainda bem!)
– Um Smoothie? Sério?- ela questiona.
O garçom ri. Eles se olham, talvez se conheçam. Ou talvez ela seja amante dele, e a esposa dele esteja por perto.
– Duplo… Com Vodka… Põe Whysky também. Ah, um pouco daquele vidro marrom- falo, destemido
– Rum-responde o garçom
(Que merda é rum?)
– Tá tudo bem? Você tem certeza de que vai pedir toda essa mistura? Não sabia que era tão resistente – diz Patrícia, sorrindo.
(O sorriso dela é lindo. Acho que o jogo vai começar a virar)
– Pronto. Smoothie de vodka com Whisky e Rum, sabor morango -disse o garçom.
– Morango? – Patrícia ri, com uma mistura de desaprovação e surpresa-Pensei que você bebia coisa de verdade.
(Porra, esse garçom é foda. Perdeu os 10% dele, por causa desse sabor morango. 3×0 pra Patrícia)
– Pois é… Morango. Logo eu, que adoro melão- ela afirma.
– Melão? Hã?
(Merda, 4×0. Eu me sinto num Brasil e Alemanha. Quer dizer…)
– Melão é uma bebida lá do meu interior, feita com cachaça na época nos escravos – ela revela
– Mas você não nasceu em Salvador?
– Pois é, no interior de Salvador… Os escravos do meu pai bebiam isso.
– Seu pai era dono de escravos?
– Não, ele era só o capitão do mato. Digo, ele era gerente da fazenda.
– Sim, sei…- respondo desconfiado
– Mas, Patrícia, me fala mais sobre você. Sempre é tão séria, sempre usa roupas bem formais…
– Fabrício, a gente trabalha no escritório de advocacia.
– Mas não quer dizer que precisa que ser séria o tempo todo.
– Jura? Vou defender os clientes agora contando piadas?
(Rio forçadamente, o que me faz parecer mais retardado que o normal)
– Você é fandega, Patrícia.
– Pândega, Fabrício.
– Não, obrigado. Vou ficar só no Smoothie.
– Não, você falou errado.
– Smoothie. Eu sempre esqueço de soprar a língua, pra fazer o “F” certinho.
– O quê?
– Esquece. Patrícia, eu vou direto ao ponto.
– Diga!
– Quer sair comigo?
– Sim, lógico. Aqui está muito chato, né? Eu te dou carona. Vamos.
– Não, sair juntos.
– É, eu sei. Mas essa era a deixa pra não ter que te dar um fora. Não é justo pegar um fora no último dia da humanidade, não acha?