Trilha:
Esqueça essa coisa de que esse o texto é meloso. Não é uma dose de fossa, nem um choro de alguém que foi abandonado, ou relato que mais parece música da Marília Mendonça. Mas não se engane. É trágico, cômico e sádico. É que eu não sei me despedir. É que eu não sei desligar o telefone, antes de lutar com a câimbra e correr pra perto de uma tomada e carregar o celular. É que eu não sei dar o último beijo do dia e dizer até amanhã. É que, se eu pudesse, não dormiria, mesmo que tivesse sempre a certeza de sonhar com você.
Acho que a dificuldade em não saber se despedir é a vontade de querer ficar. Há amores calmos e perenes, que mais parecem uma rede estendida numa varanda, com passarinhos cantando ao fundo. Mas há aqueles que cortam os punhos e nos fazem cair em queda livre. Esses urgentes e imperativos chegam com toda pose — ou seria posse? — Não sei. Só sei que podem ou devem consumir o mundo. Assumem o controle de tudo e nos reduzem ao nada. Não há passado, porque até na prequela, ele existe. Sabe-se lá como, mas está ali, infiltrado nas entranhas do ser, mesmo antes de estar.
E desse sentimento que mais parece chaga, quem se atreveria se despedir? É por isso que ouvir sua voz é como ouvir o canto hipnótico de um ser encantado. É o imã irresistível, que dorme na beira do precipício. Chamaram isso de gravidade. E deve ser mesmo: grave. Tão grave, que ficou gravado como pele em mim. Eu não sei me despedir de você, ainda que se despedir seja um beijo de até logo. Eu não sei se não sei, se não posso ou se não quero.