Trilha:
Em breve, não seremos esse par que parece eterno. Em breve, enlaçaremos outras mãos e pertenceremos a outros corpos. Em breve, seremos tanto de outros, tais como jamais fomos um do outro. Em breve, nosso amor se esfriará tão de repente quanto pegar no sono e, acredite em mim, você sequer perceberá que adormeceu. Vai doer sim, durante um tempo. Até a gente se acostumar à falta (e se sentir mais livre) que com saudades. Em breve, o seu beijo, que hoje é perdição, vai se perder em minhas lembranças. Em breve, o seu insólito abraço, que hoje transpassa toda dor, será como relva nos campos. Em breve, seremos, um para o outro, lembranças vagas, pouco visitadas, tipo aquele vestido azul, que era seu preferido e hoje não lhe cabe mais.
E o que faremos nós, antes que a música cesse e as cortinas se fechem? Seremos lamento e pranto pretenso? Ou seremos reféns de um destino traçado e nos entregaremos à melancólica certeza de que fatalmente, mais cedo ou mais tarde, chegaremos ao fim? Podemos brincar com essa sina sarcástica e, em nossa finitude, tentar o absurdo de ser eterno enquanto dure. Podemos nos enganar com promessas malditas, que nos pesarão o peito, no momento da partida, e cobrarão com juros lágrimas sofridas. Podemos ir além, viajar pra aquele lugar que a gente guardou pra o grande amor de nossa vida e se enganar que estamos realmente vivendo isso, porque, afinal, uma hora vai acabar.
A gente pode ser feliz sem pensar que, amanhã, a felicidade aquecerá uma dor que vai nos queimar por inteiro e arder como febre. A gente pode ser um do outro, ainda que isso nos custe, num futuro, seguir em diante incompletos. A gente pode ser esses erros deliciosos, que misturam na mesma proporção tudo de bom e de ruim que uma relação pode e deve ter. A gente pode ser a bagunça confortável que somente os amores que marcam podem nos dar. A gente pode ser o erro bonito, que vira pintura na arte, cicatriz nas quedas e saudade na vida. A gente pode, mas será se a gente deve? Não sei. Diga você. Por mim, a gente pode ser.
#espalheamorporaí #DQ138