Uma decisão polêmica promete gerar uma grande discussão envolvendo a comunidade jurídica, a sociedade civil e as entidades de defesa dos direitos humanos. A juíza Jaqueline Reis Caracas, da 1ª Vara da comarca de Paço do Lumiar (MA), acaba de proferir uma decisão judicial, que garante a absolvição de Francisco das Chagas Rodrigues de Brito, o “Chagas” (foto), no crime do menor Jondelvanes Macedo Escórcio, que desapareceu em setembro de 1991 e cujo cadáver até hoje não foi encontrado. Chagas ficou conhecido internacionalmente no triste episódio dos ‘meninos emasculados’, que marcou o noticiário policial dos jornais do Maranhão, do Brasil e do exterior.
No processo que resultou na sua absolvição, Chagas, 44 anos, foi defendido pelo advogado criminalista Charles Dias, que alegou não haver nenhuma prova da materialidade do delito e da autoria do acusado no assassinato de Jondelvanes Macedo Escórcio. Na sua defesa, Charles Dias ressaltou ainda que em outros casos envolvendo assassinatos de menores tidos como solucionados, outras pessoas confessaram os crimes, os quais estão sendo imputados injustamente a Chagas.
Em interrogatórios, na fase inquisitorial do processo, Chagas chegou a mencionar ter assassinado um menino com as mesmas características de Jondelvanes – cor morena clara, 11 anos de idade, cabelos pretos lisos – que vendia suquinhos. Interrogado, porém, em Juízo, em outra oportunidade, ele – que alegou ter sido vítima de tortura e de ameaças por parte da Polícia Civil – negou a prática do crime, dizendo inclusive que não confirmava tudo que dissera em interrogatórios anteriores.
O garoto Jondelvanes – que foi visto pela última vez vendendo suquinhos nas proximidades de um campo de futebol no Rio São João – teria sido atraído por Chagas no dia 7 de setembro de 1991. Ele teria convencido o menino a acompanhá-lo pela estrada de Ribamar até as proximidades de uma serraria para ver ninho de passarinho, quando então o enforcou e retirou seus órgãos genitais.
No período dos interrogatórios foi suscitado o incidente de insanidade mental. Foi então designada uma equipe do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psiquiatria Forense e Psicologia Jurídica de São Paulo para a realização do exame de insanidade mental. O laudo só foi entregue em abril de 2006, concluindo pela semi-imputabilidade do réu.
Meninos emasculados – Durante mais de uma década ocorreram vários homicídios na ilha de São Luís (MA) contra crianças e adolescentes, sendo que os crimes se revestiam de crueldade e desafiavam a atuação das instâncias investigativas. Para elucidar os crimes, reuniram-se as polícias militar, civil e federal, com a participação do Ministério Público. Com o desaparecimento de vários menores, várias pessoas foram presas, investigadas e condenadas.
Em dezembro de 2003, houve então o desaparecimento do menor Jonathan, levantando–se a suspeita do envolvimento de Chagas, que na época foi preso. Investigando-se sua vida pregressa, descobriu-se que ele havia morado em Altamira (PA), onde casos semelhantes já tinham ocorrido.
Aprofundadas as investigações, sobretudo depois do achado da ossada de Jonathan e de serem encontradas outras ossadas na sua casa, Chagas acabou confessando a autoria de vários crimes, chegando a admitir a emasculação, que, segundo ele, era feita como forma de uma “oferenda sacrificial” a uma entidade desconhecida.
Como cerca de duas ou três vítimas eram assassinadas anualmente, as investigações concluíram por semelhanças no modo de agir do acusado nos crimes descobertos. As vítimas eram encontradas em local ermo, próximo de suas próprias casas ou de algum lugar relacionado ao acusado, seja por causa do trabalho ou por conta de seus familiares.
Todas as vítimas, encontradas ainda em estado de putrefação, estavam sempre emasculadas. A faixa etária das mesmas – todas de sexo masculino – variava entre 8 e 15 anos. As vítimas, em sua maioria, eram encontradas perto de árvores de tucum e apresentavam lesões pelo corpo causadas por instrumentos cortante e perfuro-cortantes, apurando-se que eram submetidas a intenso sofrimento sem condições de oferecer resistência que impedisse ou dificultasse suas mortes.
Caro Daniel,
A decisão da Magistrada está mais do que correta. Ela simplesmente aplicou a LEI. Sem materialidade não existe crime. Não há invenção no disposto. Polêmica seria uma decisão condenando alguém sem nenhuma prova material. A investigação está incompleta.
Qual a fonte desse texto? Ele nao saiu da Assessoria de Comunicação do TJ, conforme vc postou. Por favor envie seu número de contato. Estamos aguardando.
Ascom TJ
Não tenho a menor dúvida que a ausência do cadáver inerente ao menor desaparecido e confessado o delito cometido pelo acusado Chagas perante a Polícia Civil ainda que com a presença de Membros do Ministério Público estadual, na fase inquisitorial (de Inquérito Policial), poderia acarretar a absolvição do referido serial killer. O que de Direito aconteceu. Contudo, não vejo como obter absolvição nos casos correlatos aos corpos enterrados na residência dele, bem como no caso Jonatham, pois, além da confissão, outras provas materiais foram profundamente coletadas nos bojos dos Inquéritos Policiais confeccionados, além, obviamente, dos laudos psiquiátricos requisitados pelo Poder Judiciário, durante toda a descoberta, localização, prisão e confissão de Chagas, nos inúmeros trabalhos investigativos realizados à época.
Afora a confissão,outras provas materiais e imateriais coletadas, temos como testemunho maior de que Francisco das Chagas é realmente o autor dos casos dos “Meninos emasculados do Maranhão e de Altamira no Pará”, quando do período de sua prisão para cá, há de se registrar a inexistência de notícias de desaparecimento ou de crimes semelhantes acontecidos nesses últimos quatro anos, tanto no Maranhão como no Pará.
Tive a oportunidade de realizar a identificação, prisão e anunciar que Chagas era o tão procurado criminoso, ainda no mês de dezembro do ano de 2004, pois as semelhanças dos casos, assinaturas e modus operandis estavam tão presentes que, na época, conseguimos a prisão preventiva dele, mesmo sem o aparecimento do corpo de sua última vítima, apenas com as provas recolhidas e laudo psicológico produzido pelo Dr. Carlos Leal, embora termos sido bastante questionado e posto em dúvida os métodos investigativos realizados, ou seja, trabalhamos com vestígios imateriais deixados pelo referido, e utilizamos a vida biográfica dele, durante o seu primeiro interrogatório, cujas folhas produzidas foram, salvo engano, em torno de 36 páginas, onde ali estava desenhada toda sua vida pregressa,além de detalhes dos principais casos acontecidos, sem que ele percebesse toda a trajetória revelada.
È fácil se recordar que quando perguntado pela CPI da Exploração Sexual, a deputada estadual Helena Hily perguntou ao Chagas se haviam o espancado e se ele estava confessando os crimes de livre e espontânea vontade, o que, de forma cristalina, asseverou que não tivera sofrido qualquer tipo de violência durante as investigações, e o por quê ter resolvido confessar os crimes, ocasião em que perante dezenas de pessoas presentes, negou ter sofrido qualquer tipo de tortura, bem como havia recebido um “comunicado” que tinha chegado a hora de parar com estava fazendo. É só forçar a memória e a riquidez de detalhes expostos por ele, após intensas inquirições levadas a efeito pelas investigações que sucederam às inicialmente realizadas.
Complementando os trabalhos iniciais realizados pela Superintendência de Polícia Civil da Capital que na época estava sob meu comando, bem como pela Equipe de Policiais Civis da Delegacia Especial da Cidade Operária, sob coordenação da então titular, Delegada Edilúcia Trindade, o ex-secretário de Segurança Pública e atual Deputado Estadual Raimundo Cutrim, designou o delegado Diniz para, acompanhado por promotores de Justiça do Grupo de Combate a Organizações Criminosas do Ministério Público estadual, realizar todas as investigações complementares, cuja conseqüência se dera na confirmação em definitivo que Chagas era o verdadeiro autor dos crimes relacionados com as crianças desaparecidas e emasculadas no estado do Maranhão.
Assim, mesmo que hoje o discurso de defesa usado por Chagas e com certeza escolarizado no ambiente penitenciário onde se encontra, inclusive pela já sua inteligência aguçada nata,não seria estranho esperar argumentos de que tivera sido torturado durante o período a que esteve sob investigação da POLÍCIA JUDICIÁRIA deste estado, onde, praticamente do começo ao final, o Órgão de Controle Externo da Atividade de Polícia ( o Ministério Público) esteve veementemente presente em incansáveis diligências acontecidas e até mesmo realizadas em conjunto.
Porém, a meu ver, sua absolvição no caso divulgado se dera pela ausência do corpo da vítima, onde, pelo fato de o crime a ele imputado a autoria ser qualificado como de resultado ou material, imprescindível para sua comprovação a existência do corpo, mas pelo tempo do fato e inúmeros percalços, impossibilitado se tornou a localização do mesmo. O que, mesmo com a confissão do acusado, ainda que perante a magistrada, não elidiria a possibilidade de sua absolvição pela aplicação concreta das leis penal e processual penal brasileira no caso apreciado pela Justiça,sobretudo por questões de meras formalidades legais.De forma que, não vejo e sinto abertura de precedentes para os inúmeros outros casos assumidos e comprovados nos inquéritos confeccionados, cuja autoria certa, ali ficaram devidamente comprovadas, tendo como Chagas protagonista maior do crimes acontecidos. Portanto, é só ter paciência e continuar acreditando na Justiça que, com certeza, as imputações da responsabilidade de vários crimes de homicídios cometidos pelo acusado Francisco das Chagas, serão declaradas, pois acredito que, a mesma caneta que escreveu a absolvição de Chagas no caso acima, com certeza, considerar-lo-á culpado em vários casos devidamente comprovados nos autos dos Inquéritos Policiais remetidos à Justiça. É só questão de tempo e esperar para ver e crer.
Sebastiao Uchoa – Delegado de Polícia Civil
Resposta: Bela contribuição, delegado. Saudações!
Parabéns, Delegado SEBASTIÃO UCHOA, pela análise – de meridiana clareza – desse caso terrível! Para nós, leigos, é de suma importância esclarecimentos como o seu, explicando todas as nuances do processo, para que não fiquemos pensando mal da Justiça.
Oxalá outras autoridades tenham o mesmo procedimento, sempre que se fizer necessário. (JORGE DA BELIRA).