*Luiz Eduardo Neves
Percorrer as estradas do Maranhão de carro é um verdadeiro exercício de paciência e resistência. A tensão é constante, o desgaste grande e a paisagem nem sempre é agradável de se ver. Em muitos trechos das BR-226 e BR-135 acostamento e sinalização são luxos, simplesmente não existem. Entretanto, o mato, os animais mortos, os urubus e a pobreza são quase que onipresentes, bem como os numerosos buracos e jumentos, que aparecem em grupos, sempre soltos, maltratados, expostos sob sol e chuva, colocando a vida dos motoristas em risco.
O Maranhão é uma espécie de ilha da Terra do Nunca, aquela do romance de James Barrie. Na terra de Peter Pan tudo é permitido, nesta terra acontece o mesmo. Permite-se que motos, carros e caminhões andem por cima de crateras de todo tipo na BR-135 até São Luís. É permitido ainda parar as obras da duplicação da BR e deixar à mostra pelo caminho toneladas de concreto e ferro. Morrer tragicamente na rodovia também é permitido, seja por atropelamento, colisão entre veículos ou latrocínio.
Nesta terra, que faz parte de uma outra terra maior ainda, existem muitos capitães-gancho, uma grande quantidade de piratas e de ratos também. A eles é permitido roubar a felicidade da população, a usurpar seus recursos financeiros sem culpa, a ameaçar seus empregos, a tomar seus territórios, a colocar em xeque seus direitos e aniquilar sua dignidade e tudo em troca de interesses pessoais escusos.
Mas observo que a população também se permite ao conformismo – claro que existem belos exemplos de exceção – e ao apego do discurso escorregadio da grande mídia. Se permite à falta de engajamento, se permite apenas reclamar, esbravejar, olhar para o próprio umbigo e ter ódio.
Às vezes imagino que estou preso em um mundo paralelo, semelhante aos personagens do desenho animado Caverna do Dragão. Sentimentos como impotência e tristeza tomam conta de mim. Me senti assim no último sábado ao passar pela BR-135, veio ao meu pensamento que a destruição da rodovia constitui apenas uma das muitas faces do nosso esfacelamento social e do grave coma político que vivemos.
*Geógrafo e professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA)