Membros do IHGM lançam manifesto contra ação judicial que pode retirar homenagem a Nina Rodrigues no maior hospital público psiquiátrico do Maranhão

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Justiça convocou para 18 de fevereiro de 2025 audiência pública para ouvir representantes de segmentos da sociedade e a população em geral sobre o tema

Fachada do Hospital Nina Rodrigues, na Avenida Getúlio Vargas, no bairro Monte Castelo, em São Luís

MANIFESTO DE MEMBROS DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO MARANHÃO ACERCA DA DEMANDA JUDICIAL EM DETRIMENTO DA MEMÓRIA DE NINA RODRIGUES

“Nina Rodrigues lançou os fundamentos da antropologia e etnologia do negro brasileiro..Neste campo de pesquisas tudo o que se tem feito e poderá realizar não prescindiu, não prescinde, nem prescindirá dos trabalhos do insigne maranhense como ponto de partida ou de referência.”

Antônio Lopes, 1946

“Nina Rodrigues escrevia bem e fundamentava seus escritos em pesquisas de campo minuciosas. É lamentável que hoje em dia a maioria dos seus trabalhos não estejam disponíveis ao público.”

Sérgio Figueiredo Ferretti, 2002

Os membros do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM) abaixo assinados, cientes da existência de processo judicial por via de ação popular com o propósito de retirar a denominação do principal hospital psiquiátrico do Estado do Maranhão instalado na capital, que homenageia o grande maranhense Nina Rodrigues, sustentando seu autor que a designação, mantida há mais de 80 anos, feriria, em tese, o princípio da moralidade administrativa, e qualificando aquele cientista do passado como apologista de teorias eugenistas.

Considerando que existe, no bojo do referido processo, audiência pública convocada para o dia 18 de fevereiro de 2025.

Considerando a contribuição de Raimundo Nina Rodrigues para a antropologia, a psiquiatria, a medicina legal, os estudos afrobrasileiros e a cultura nacional, enfim, destacando-se ele em pesquisas nesses e em outros ramos do conhecimento.

Primeiro consultório de Nina Rodrigues em Sao Luis (1888), na Rua do Sol, no Centro Histórico de São Luís

Considerando ser ele reconhecido como fundador da antropologia criminal brasileira e pioneiro nos estudos sobre a importância do negro na formação do Brasil.
Considerando que Raimundo Nina Rodrigues viveu de 1862 a 1906, sendo, pois, a sua atuação científica informada, como não poderia deixar de ser, pelas teorias do seu tempo, algumas reconhecidas hoje como racialistas, mas que eram predominantes no mundo científico então.

Considerado que a imputação de que ele praticou “racismo travestido de ciência”, dentre outros desqualificativos semelhantes no processo em trâmite, desmembra seu pensamento ao mesmo tempo em que o resume a esses subjetivismos, deixando de apresentar a vasta, pioneira e profunda produção científica da lavra de Nina Rodrigues sobre a presença negra no país, como lembrado por africanistas consagrados, entre os quais o saudoso professor da Universidade Federal do Maranhão Sérgio Figueiredo Ferretti.

Considerando que a discricionariedade do Estado do Maranhão em homenagear Raimundo Nina Rodrigues está diretamente relacionada às efetivas contribuições que este renomado médico e pesquisador deixou para o saber acadêmico.

Considerando que o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, segunda instituição cultural mais antiga do Maranhão, fundada em 1925, tem por missões estatutárias (art. 1º): I – estudar, debater e divulgar questões sobre História, Geografia e ciências afins, referentes ao Brasil e, especialmente, ao Maranhão; II – cooperar com os poderes públicos que visem ao engrandecimento científico e cultural do Estado, colocando-se à disposição das autoridades para responder a consultas e emitir pareceres sobre assuntos pertinentes às suas finalidades; III – defender e velar o patrimônio histórico do Maranhão.

Considerando a lição legada pelo principal fundador do IHGM, o erudito Antônio Lopes (1889–1950) – “Cultuar a tradição, venerar o passado, estudar o Maranhão, eis para que foi criado o Instituto. Bendito culto, que evoca o passado para o brilho do presente e torna cada vez mais entranhado o amor à terra maranhense e suas glórias”.
Considerando a obrigação, que temos, como membros do IHGM, de defender esse patrimônio imaterial, no qual o nome de Nina Rodrigues, patrono de uma de suas cadeiras (N.º 28), assim como de cadeiras de outras entidades respeitáveis do Estado, a exemplo da Academia Maranhense de Letras, aparece como uma das mais notáveis figuras do nosso passado cultural.

Registro do Departamento de Cultura do Estado, datado de 1962, na fachada do primeiro consultório de Nina Rodrigues na capital maranhense

Considerando que cada personagem histórico deve ser estudado e entendido no contexto da época em que viveu, sem lhe negar os méritos que tenha eventualmente demonstrado, embora sem deixar de submeter suas ideias à crítica científica; e considerando que a iconoclastia irresponsável, representada pela injustificada demolição de estátuas e monumentos, pela supressão de símbolos e homenagens, é a tradução de um ingênuo desejo de modificar o passado, e não uma expressão de genuína abordagem científica e ética, visando à sua superação, pelo aproveitamento de contribuições positivas e pela refutação do que se revelou obsoleto para o mundo contemporâneo.

CONCLAMAM OS INTELECTUAIS E ESTUDIOSOS MARANHENSES E BRASILEIROS A CERRAR FILEIRAS PELA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA MARANHENSE E NACIONAL, especificamente, defendendo a manutenção da homenagem do Estado do Maranhão a Raimundo Nina Rodrigues como designativo do “Hospital Psiquiátrico Estadual Nina Rodrigues”, por considerarem que a referida denominação faz jus às suas contribuições aproveitáveis para a formação do pensamento científico e que tal supressão, por si só, não traz nenhum benefício social, mas, ao contrário, contribui para impedir que a sociedade conheça a formação do pensamento e sua própria história.

São Luís, Maranhão, 2 de janeiro de 2025.

Raimundo da Silva Costa, cadeira N.º 28
Diogo Gualhardo, cadeira N.º 56
Washington Cantanhêde, cadeira N.º 58
Natalino Salgado Filho, cadeira N.º 12
Ruy Palhano, cadeira N.º 06
Ronald Pereira dos Santos, cadeira N.º 31
Leopoldo Gil Dúlcio Vaz, cadeira N.º 40
Antônio Guimarães, cadeira N.º 09
Euges Lima, cadeira N.º 22
José Almeida, cadeira N.º 08
Josiel Ribeiro Ferreira, cadeira N.º 49
Raul Eduardo de Canedo Vieira da Silva, cadeira N.º 41

4 comentários para "Membros do IHGM lançam manifesto contra ação judicial que pode retirar homenagem a Nina Rodrigues no maior hospital público psiquiátrico do Maranhão"


  1. Raimundo n.s. Gomes

    É lamentável uma situação dessa, jamais se pode querer apagar a memória ou o legado daquele que foi de grande importância para o nosso estado.

  2. Antonio Guimarães De Oliveira

    Como cidadão maranhense, vejo um despropósito dessa ação visando retirada do nome do hospital Nina Rodrigues, um caso sério, já pensou se tirasimos as homenagens ao nosso José Sarney seria justo. Jovem advogado, procure outra causa como defensor público para necessitados.

  3. Paulo Helder Guimarães de Oliveira

    Esta possível mudança de nome, representa um atraso a nossa cultura, um balde de soda cáustica sobre um nome tão importante, para a nossa história. Diga NÃO a esta mudança. E digo mais, o autor deste projeto, prova não conhecer nossa história.

  4. Celia Maria Prazeres

    Qual benefício traria ao retirar o nome do hospital Nina Rodrigues? Tantas prioridades no Maranhão tem situações que precisam serem resolvidas com urgência.O autor do projeto deveria estudar, valorizar nossa história, respeitar quem contribuiu com a sociedade maranhense, com a saúde do nosso estado, Os autores desses projetos retrógrados, se baseiam em teses infundadas para por em práticas suas vontades.

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