Natalino Salgado Filho*
Reportagem publicada nesta semana pelo jornal El País, de Espanha, traz análise interessante do Doutor em Psicologia, Adam Alter, acerca do fenômeno onipresente no dia a dia de todos nós: a adição às mídias sociais. Ele citou o fato de que “em 2015, uma pessoa em média ficava três horas na frente de uma tela. Em 2017, esse tempo subiu para quatro horas”.
Mas a preocupação desse estudioso não se resume ao tempo gasto em atenção ao que está sendo postado, comentado, compartilhado nas mídias sociais. Para Alter, as mídias sociais retiram o tempo precioso do tédio – responsável por ocasionar boas ideias – e servem para formatar pensamentos e posturas, vez que as pessoas tendem a se agrupar com aqueles que pensam e agem da mesma forma que elas.
O psicólogo adverte: está em risco a própria criatividade e inovação que poderiam advir do exercício democrático e saudável do debate plural. O pesquisador chega a comparar essa dependência com o mundo virtual a outros vícios, esses velhos conhecidos da sociedade; e defende estratégias para que as pessoas possam se defender do que considera “mal inevitável”.
O tédio a que se refere Alter tem, suponho, inspiração numa proposta interessante do sociólogo italiano Domenico de Masi que, em meados dos anos 1990, lançou a ideia no livro “O ócio criativo”. Ali ele defende que esse tipo de ócio é a união do trabalho, estudo e lazer. Não é não fazer nada. Mas dispor de tempo equilibrado entre essas atividades que, afinal, definem de muitos modos nossa própria identidade e aí está o espaço para desabrochar a criatividade.
O outro ócio, aquele associado à preguiça cantada por Caymmi, é inútil, vazio e alienante. De fato, ele nos reduz ao atraso, ao desprazer e até mesmo a uma sensação melancólica em relação à vida.
Tempo dedicado a ver, por exemplo, atualizações no Facebook de amigos pode causar depressão, afirma uma universidade alemã (Universidade Humboldt de Berlim). Uma em cada três pessoas relataram se sentirem piores e mais insatisfeitas com a própria vida depois de visitar a rede de relacionamentos. Sentimentos de ressentimento e inveja também foram relatados pelos participantes da pesquisa.
Pesquisa disponível, a partir do relatório 2018 Global Digital (pode ser acessada no site https://wearesocial.com) revela uma dado impressionante acerca do Brasil. Aqui, o brasileiro gasta, em média, quase dez horas conectado à internet, sendo que mais de 3 horas e meia são dedicadas às redes sociais. Outra pesquisa desenvolvida pela empresa Amdocs, com mais de 4 mil jovens em diversos países, revelou que os brasileiros também são os maiores usuários de mídias sociais como Facebook (94%), Youtube (85%) e WhatsApp (84%).
Para tentar evitar tanto tempo dedicado a essa atividade, foi desenvolvido até um aplicativo, o QualityTime, que oportuniza aos interessados saber quanto aquele que o tem gasta de seu tempo navegando nas mídias sociais. O aplicativo foi desenvolvido pela ZeroDesktop Inc., e é um dos recordistas na Play Store.
Mas, afinal, o que a constatação do Dr. Alter tem a nos dizer? Naturalmente não é que se deva abandonar as redes ou retornar a um estado pré internet, mas como tudo na vida, usar como parcimônia, equilibrar vida virtual e real. Manter e cultivar relações reais, sair ao ar livre, ser produtivo de algum modo e, quem sabe, seguir os conselhos de De Masi.
*Professor Titular da UFMA e membro das Academias: Nacional de Medicina e de Letras do Maranhão