Mutuários da Caixa Econômica Federal de São Luís que obtiveram financiamentos imobiliários para a compra da casa própria nos últimos anos podem ficar tranquilos. Segundo a assessoria do banco, os cerca de 5 mil contratos de financiamento investigados pela Polícia Federal (PF) na operação deflagrada ontem (18) passaram por uma auditoria e, do ponto de vista dos recursos liberados aos clientes, estão regulares. Ainda de acordo com a informação fornecida à Agência Brasil, nenhum contrato precisa ser anulado ou reformado.
A Caixa, no entanto, aguarda ter acesso aos autos da investigação para, se ficar provado que servidores, empresas credenciadas como correspondentes bancários imobiliários (empresa que trabalha recebendo, preparando os documentos necessários à concessão de financiamento imobiliário e entrega-os nas agências do banco) ou construtoras cometeram as irregularidades apontadas pela PF, tomar as medidas judiciais e administrativas cabíveis. O processo tramita em segredo de Justiça.
Ainda segundo a Caixa, as investigações policiais sobre o esquema fraudulento que motivou a deflagração da Operação Cartago tiveram origem em suspeitas identificadas pela própria Caixa Econômica Federal há pelo menos dois anos. Foi quando o banco estatal instaurou um procedimento administrativo para apurar se servidores de algumas agências de São Luís (MA) tinham aberto escritórios particulares para atuar como correspondentes bancários imobiliários da Caixa.
Pelas regras da própria instituição e do Banco Central, um correspondente não pode ter parentesco com funcionários do banco e nem atuar no interior de agências. Após ser acionada pela Caixa e investigar as suspeitas por dois anos, a PF concluiu que empresas eram criadas em nome de parentes ou pessoas próximas aos servidores do banco. Os escritórios eram então contratados para prestar aos clientes da instituição serviços como correspondentes bancários imobiliários.
“Aí começa o esquema fraudulento. Muitos mutuários que procuravam a Caixa interessados em financiar um imóvel eram atendidos por esses servidores que, depois, simulavam que o atendimento tinha sido feito pelas empresas irregulares”, explicou o delegado federal Sandro Jansen, que coordenou a Operação Cartago. De acordo com o delegado, embora os contratos fossem fechados no interior das próprias agências, por servidores da Caixa ligados ao esquema, em horário de serviço, as empresas investigadas recebiam uma comissão de 3% do valor do financiamento concedido.
Senhas
Ainda de acordo com a PF, empregados desses escritórios particulares chegavam a ter acesso às senhas restritas de empregados do banco público. Embora ainda não seja possível precisar o valor obtido ilegalmente pelo esquema, o delegado diz haver indícios de que o grupo atuava desde pelo menos 2010 em pelo menos seis agências da capital maranhense e que há mais de 5 mil contratos sob suspeita de terem sido assinados durante o período, totalizando uma movimentação financeira de R$ 500 milhões. A PF ainda não sabe de quanto desse montante os suspeitos podem ter se apropriado a título de taxa de corretagem.
Cinco servidores da Caixa já haviam sido demitidos por envolvimento com o esquema antes mesmo da PF deflagrar a Operação Cartago. Ontem, mais sete foram afastados de suas funções até que as suspeitas de que são alvo sejam esclarecidas. “São empregados que continuavam trabalhando na Caixa e que, a partir de agora, estão suspensos de suas funções e com o acesso aos sistemas internos do banco bloqueados”, disse o delegado, que garantiu à Agência Brasil ter elementos suficientes para indiciar 18 pessoas, entre elas os 12 servidores.
Fragilidade
Para o secretário-geral do Sindicato dos Bancários do Maranhão, Eloy Natan, os fatos revelados pela Operação Cartago expõe a “fragilidade” da opção dos bancos por terceirizar serviços sensíveis. “Há aí um problema, que é a questão da privatização dos bancos públicos, da terceirização, que, além de precarizar os serviços, pode se tornar uma fonte de corrupção, já que interesses públicos e privados passam a se misturar em um negócio de grande alcance social, que é a habitação”, declarou Natan.
Desde o ano passado o sindicato dos bancários maranhense vem denunciando a presença de correspondentes bancários trabalhando no interior de agências de bancos públicos. Com base na Resolução nº 4.035 do Banco Central, de novembro de 2011, o sindicato vem oficiando as superintendências de bancos públicos por tal expediente.
“Existe sim a possibilidade de fraudes semelhantes estarem ocorrendo em outros lugares. Boatos a respeito da atuação indevida de correspondentes bancários nós tínhamos ouvido não só em São Luís, mas, geralmente, se limitam ao uso indevido do espaço. Agora, eu não estranharia se a PF e o Ministério Público investigassem e encontrassem casos semelhantes em outros lugares”, diz o sindicalista.