SÁLVIO DINO: AMIGO, COMPADRE, CONFRADE

0comentário

Transporto-me para o limiar dos anos 1960 e lembro da Assembleia Legislativa do Maranhão, para onde Sálvio Dino, pelo PDC, e eu, pelo PSP, nos elegemos deputados estaduais, e integrados à bancada das Oposições Coligadas.

Aportávamos no Poder Legislativo no fulgor da mocidade. Eu, ainda estudante da Faculdade de Direito de São Luís, ele, já bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, portanto, militando na advocacia, depois de brilhar na política estudantil, atuando no Grêmio Cultural do Colégio de São Luís, no Centro Acadêmico e no Parlamento-Escola da Faculdade de Direito, onde fundou o jornal Voz Universitária. 

VEREADOR Á CÂMARA MUNICIPAL

Essas participações na vida universitária, o credenciaram a concorrer à Câmara Municipal de São Luís, nas eleições de 1954, elegendo-se vereador e teve desempenho invulgar, sendo considerado pela imprensa, pelos projetos apresentados e propostas defendidas, o melhor edil da legislatura.

De sua autoria, entre os mais destacados, o projeto de criação do ginásio municipal, o que obrigava aulas inaugurais na rede pública municipal, a elaboração de um Plano Urbanístico de São Luís, a concessão de 50 por cento de desconto para os estudantes nos transportes coletivos, a criação da Secretaria da Agricultura do Município e a nomenclatura das ruas da capital maranhense.

Paralelamente, atuava nas redações dos jornais e revistas da cidade, a exemplo de Afluente, O Indicador Maranhense e O Panorama, em que publicava matérias literárias em prosa e verso.

ADVOCACIA E POLÍTICA

Após cumprir o mandato na Câmara Municipal, Sálvio decide se dedicar inteiramente à profissão de advogado, no exercício da qual publica o seu primeiro livro: “Um moço na tribuna”.

Em plena ação profissional, é designado pelas Oposições Coligadas, para acompanhar as eleições de 1960, na região tocantina, para impedir os governistas de praticarem uma grosseira fraude eleitoral, contra o candidato Clodomir Millet.

Pela brava luta contra a distorção da vontade eleitoral, Sálvio ganha notoriedade, admiração e prestígio, que o fizeram continuar atuando profissionalmente em Imperatriz e cidades que ficavam em seu entorno, oportunidade em que viu em toda a plenitude a deflagração da coação policialesca, a cobrança arbitrária de impostos, a submissão dos mais pobres aos poderosos e a exploração do homem rural pelos latifundiários.

Com o sentimento de defender os humildes da região tocantina, que começava a crescer a olhos vistos e a despontar pelas oportunidades que oferecia ao empresariado, se candidata a deputado estadual, nas eleições de 1962. Malgrado as dificuldades financeiras e as intimidações políticas, elege-se com expressiva votação à Assembleia Legislativa do Estado.

MANDATO DE DEPUTADO ESTADUAL

Em janeiro de 1963, assume o mandato parlamentar e no plenário do Poder Legislativo, consolidamos a nossa amizade e passamos a atuar juntos e coesos, no que contamos com o companheiro de luta, o deputado, Ricardo Bogéa, e formamos um grupo que se impôs no desempenho do mandato de forma ética e com um discurso político, sintonizado com as mudanças estruturais, as reformas de base  e os problemas sociais, reclamadas pelo País que o Presidente da República, João Goulart, procurava implementar.

Pelas nossas vozes, os protestos contra as iniquidades sociais e o atraso econômico vigentes no Maranhão, passaram a ser levantados e discutidos no plenário, onde se exigia dos governantes atitudes administrativas para a mudança dessa triste realidade, o que irritava a bancada majoritária e os detentores do poder, que nos intimidavam e nos rotulavam de extremistas, agitadores e esquerdistas.

O EXPURGO DA VIDA PÚBLICA

A oportunidade para sermos expurgados da vida pública chega com a deflagração do movimento militar em abril de 1964, por meio de um plano maquiavélico, articulado no Palácio dos Leões, contra os deputados que defendiam as causas populares.

Sem perda de tempo, veio do IV Exército, um cabograma mandando a Assembleia Legislativa “cassar os mandatos de Sálvio Dino e de Benedito Buzar, e, se fosse o caso, de Ricardo Bogéa.”

Ao arrepio da Constituição e por um ato ilegal e arbitrário, no dia 25 de abril de 1964, perdemos o nosso mandato, conquistado democraticamente nas eleições de 1961. 

DEZ ANOS DEPOIS

Inconformado com a brutal expulsão da vida pública, Sálvio, em 1974, com o regime militar ainda em efervescência, decide se candidatar a deputado estadual, pretensão barrada pelo Tribunal Regional Eleitoral, mas derrubada em Brasília, pelo TSE.

Com a candidatura registrada, elege-se, depois de dez anos, à Assembleia Legislativa, com a maioria da votação conquistada na região tocantina. Nesse mandato, deu prioridade aos problemas do meio ambiente e da solução do polêmico caso dos limites territoriais entre o Pará e o Maranhão.

Após a legislatura de 1975-1979, graças ao seu extraordinário desempenho no plenário e nas comissões técnicas, retorna ao exercício do mandato nas legislaturas de 1979-1983 e de 1983-1987.

DO LEGISLATIVO PARA O EXECUTIVO

Quem pensava que Sálvio Dino, após cumprir três mandatos legislativos, abandonasse definitivamente a cena política, equivocou-se completamente. Como se ressurgisse das cinzas, retorna aos rincões tocantinos, para onde transfere o domicílio eleitoral, condição que o habilita a concorrer a cargos executivos, mirando a  prefeitura do recém-criado município de João Lisboa, onde ganha duas eleições majoritárias: 1987 e 1996.

A VERTENTE LITERÁRIA

Sem querer imitar José Sarney, que faz política, mas sem deixar a literatura de lado, assim foi Sálvio Dino, que mesmo antes de ingressar na atividade pública, já se dedicava a escrever poemas, crônicas, contos e romances, obras essas que pela sua dimensão cultural, fizeram com que  se candidatasse à Academia Maranhense de Letras e conquistasse, por meio de eleição, realizada em 16 de julho de 1998,  a Cadeira 32, patroneada por Vespasiano Ramos, fundada por Mariana Luz e teve como ocupantes, Felix Ayres e Raimundo Carvalho Guimarães. Quem o recepcionou na sua posse, em 16 de julho de 1999, foi este escriba, seu compadre e padrinho de seu terceiro filho, o governador Flávio Dino, produto da parceria com a primeira esposa, Maria Rita.

De sua imensa e proveitosa bagagem cultural, legou à posteridade as seguintes obras: Nas barrancas do Tocantins; Onde é Pará Onde é Maranhão; Semeando manhãs; Grandeza da terra na glória do seu povo; A trilogia da emoção; A devastação do meio ambiente importa na destruição da raça humana; Raízes históricas de Grajaú; A conciliação entre o meio ambiente e o desenvolvimento econômico; A dinâmica ocupacional dos espaços físicos do Maranhão; A Nova República; Perfil de Amaral Raposo; Luzia quase uma lenda de amor; Um palácio de histórias, lendas, mitos e chefões; Clarindo Santiago, o poeta maranhense desaparecido no Rio Tocantins; A Faculdade de Direito do Maranhão; e  A Coluna Prestes no Maranhão.  

sem comentário »

O LÍBANO DE MEUS AVÓS

0comentário

Fico pensando nos meus avós paternos, Rafiza Gattas Buzar e João Mutran Buzar, se fossem vivos, o que não estariam sentindo ao ver a terra em que nasceram e constituíram famílias,  chamada de Monte Líbano, sofrendo os horrores de uma explosão de um depósito ocupado por 2 700 toneladas de nitrato de amônio, substância altamente inflamável e usada na fabricação de fertilizantes e explosivos, por culpa da negligência de autoridades, que matou quase 150 pessoas e deixou mais de 5 000 feridos.

Não foi por outro motivo, que os meus avós trocaram o Líbano pelo Brasil no momento também de grande sofrimento, quando os povos árabes viviam perseguidos pelo Império Turco-Otomano.  

OS ÁRABES NO BRASIL   

A marcante presença dos sírios e libaneses no Brasil ganha relevância entre o final do século XIX e o alvorecer do século XX, quando da abolição da escravatura e da substituição da Monarquia pela República, movimentos que contribuíram para conduzir o país à modernização de suas estruturas, transformando o trabalho escravo em livre e deixando de ser rural  para focar-se na industrialização e na urbanização.

São Paulo, porque comandava esse processo, era a região que precisava de mais mão de obra estrangeira, por isso, passou a ser o principal agente catalizador dos contingentes árabes, que ingressaram no Brasil.

Se uma parte significativa dessa corrente migratória se fixou em São Paulo, outras, também expressivas, procuraram o Norte e o Nordeste, nas quais aportaram como mascates e posteriormente se transformaram em comerciantes, atividades em que se mostraram insuperáveis pela maneira como sabiam fazer negócios.    

OS ÁRABES NO MARANHÃO

Dentre os estados nordestinos, o Maranhão destacou-se como um ponto atrativo para os imigrantes árabes, que aqui encontraram condições para se implantar e de vencer na vida, pois força de vontade para trabalhar não faltava àquela gente.

São Luís e as cidades às margens dos rios Itapecuru, Mearim e Pindaré, atraíram em maior escala essas correntes migratórias, porque concentravam a maior parte da riqueza econômica produzida no Estado, que demandava para a capital e de onde era exportada para os centros mais adiantados.

OS PIONEIROS

Com exemplos de audácia e coragem, os árabes chegaram ao Maranhão, depois de passarem por momentos difíceis e enfrentarem adversidades de toda natureza, mas aqui souberam aproveitar as oportunidades para acumular recursos e se firmarem como figuras de realce no meio social, empresarial e político.  

Dentre os sírios e libaneses, considerados pioneiros, que fizeram nome na sociedade maranhense, como comerciantes, industriais e profissionais liberais, destacam-se os Murad, Duailibe, Jorge, Mettre,  Simão, Mouchereck, Aboud, Farah, Àzar, Maluf,  Sekeff, Sauaia, Buzar, Fiquene, Safady, Nazar, Fecury,  Waquim, Curi, Millet, Mattar, Francis, Abdalla, Tajra,  Mubarack, Tomeh, Hadad, Mohana, Haickell, Assef,  Zaidan, Chouary, Bouéres, Boabaid, Damous, Nahuz,  Saback e Dino.           

    OS LIBANESES EM ITAPECURU

Os primeiros libaneses que pisaram o solo itapecuruense, pelo que se sabe, foram Basílio Simão, Chafi Buzar, João Elias Murad e Jorge Assef.

Instalaram-se naquela terra, quando ela já havia passado pelos estágios de povoação, freguesia, vila e conquistara o status de cidade, por efeito da lei votada pela Assembleia Provincial e sancionada pelo vice-governador, Silva Maia. A população do município não excedia a dez mil habitantes, sendo administrada não mais por presidentes das Câmaras de Vereadores, mas por intendentes, nomeados ou eleitos.

No momento em que se fixaram em Itapecuru, o Maranhão dava mostras de que, com a extinção da escravatura, um parque têxtil havia se instalado, sustentado na disponibilidade de capital originário da atividade agroexportadora.    

  Esse desenvolvimento da economia maranhense ajudou os árabes a expandirem os negócios e de convencerem os parentes que ficaram no Líbano a virem para o Maranhão, terra que os recebeu de modo fraterno e onde prosperarem.

MEUS AVÓS EM ITAPECURU

Rafiza e João Buzar, ambos nascidos em Zahle, ela, com 25 anos, ele, com 31, vieram para Itapecuru a convite do primo Chafi Buzar, pai do compositor Nonato Buzar, já estabelecido na cidade e desfrutando de boa situação financeira.

Incentivado pelo primo, um comerciante conceituado na cidade, e na certeza de que dele receberia ajuda para conquistar um lugar ao sol em terras maranhenses, João convenceu Rafiza, mulher destemida e trabalhadora, a mudar de ambiente. Com as economias amealhadas, embarcaram num navio até Marselha, na França, e daí tomaram outro navio, com destino a Salvador, na Bahia, onde desembarcaram no dia 21 de abril de 1913.

Além da restrita bagagem, Rafiza trazia na barriga um ser humano em adiantado estado de gestação, fato que fez ela se submeter ao trabalho de parto, na cidade de Juazeiro, cidade baiana, às margens do Rio São Francisco, onde nasceu um bebê do sexo masculino, que recebeu o nome de Abdala, em homenagem ao avô, mas só registrado no cartório de Itapecuru, como nascido naquela cidade, em 15 de novembro.

Quando Rafiza e João Buzar chegaram em terras brasileiras, não possuíam nenhum documento de identidade, pois era assim que a maioria dos sírios e libaneses atravessava as fronteiras estrangeiras.

O casal deixou os filhos do primeiro casamento no Líbano. Anos mais tarde, em 1922, dois filhos de João Buzar, Ana e Nagib, vieram para o Maranhão, moraram algum tempo em Itapecuru, mas depois mudaram-se para a cidade de Codó.

Desde o dia em que colocaram os pés em Itapecuru, Rafiza e João Buzar não perderam tempo. Com o dinheiro trazido do Líbano e o conquistado no processo de mascate, trabalharam incessantemente, inobstante as dificuldades de comunicação, pois o que importava a eles era vencerem as adversidades, prosperarem nos negócios e contribuírem para o engrandecimento da terra que os recebeu fraternalmente.

INICIATIVAS EMPRESARIAIS

As primeiras iniciativas dos Buzar na área comercial, voltaram-se para a venda de artigos de primeira necessidade e de secos e molhados. Compravam produtos manufaturados nas lojas da Praia Grande e os traziam para oferecer à população da cidade e dos povoados ribeirinhos.

O primeiro estabelecimento foi montado nas proximidades da Beira-Rio, num amplo prédio que servia também de residência. Com a expansão dos negócios, mudaram-se para a Rua do Egito, um imóvel bem mais amplo, onde Rafiza deu à luz a outro filho homem, de nome João José, que, mais tarde, junto com o irmão, Abdala, incrementaram os negócios da firma e partiram para uma ousada  empreitada empresarial: a instalação de equipamentos industriais para pilar arroz e fornecer algodão sem caroço para as firmas que formavam o parque têxtil em São Luís.      

sem comentário »

MARANHENSES E LORD COCHRANE

0comentário

Na semana passada, abordei um episódio histórico, que merece ser devidamente esclarecido a respeito da verdadeira data da Adesão do Maranhão à Independência do Brasil: 20 ou 28 de julho de 1923.

Para complementá-lo, nada mais oportuno do que tratar da rumorosa participação do militar escocês, Thomas Alexander Cochrane, mais conhecido por Lord Cochrane, considerado herói e vilão, mas contratado por D. Pedro para livrar o nosso país do jugo colonialista português.

LORD COCHRANE NA AMÉRICA

O almirante escocês notabilizou-se na Marinha inglesa no período das guerras napoleônicas, nas quais ganhou fama e contratos em vários países da América do Sul, para atuar como comandante nas lutas armadas pela independência da Argentina, do Peru e do Chile, em que, na condição de mercenário a serviço da liberdade, conseguia por manobras ousadas, que pregavam o inimigo de surpresa, libertar os países do domínio da América espanhola. 

Para participar dessas lutas, geralmente travadas no mar, Cochrane cobrava recursos escorchantes, que nem sempre os países podiam assumir, fato gerador de desentendimentos com os governos, que se viam sujeitos a atos de pirataria e de saques perpetrados pelo ardiloso almirante.     

LORD COCHRANE NO BRASIL

Com a missão cumprida e as relações arranhadas com os países da América espanhola, Cochrane volta as suas vistas para o Brasil.

Em 1822, D. Pedro precisava, para comandar as lutas em favor da Independência do Brasil, de um líder para ficar à frente da Marinha e enfrentar as forças portuguesas que atuavam nos Estados do Pará, Maranhão, Pernambuco e Bahia.

As negociações do governo do Brasil logo se estabeleceram com o almirante, ao qual foram feitas promessas vantajosas, destacando-se um decreto que a ele garantia “todas presas(cargas) tomadas na guerra de propriedade de quem capturar”.

A 13 de março de 1823, o almirante desembarca no Rio de Janeiro, de onde começa os preparativos para atacar os portugueses na Bahia, para o que contaria com navios precários e marinheiros despreparados para a guerra, mas graças à sua competência e experiência, derrota os portugueses, com a captura de 16 navios e 2.000 prisioneiros.

COCHRANE NO MARANHÃO

Depois de esmagar a esquadra lusitana (2 de julho de 1823), o almirante vem para São Luís do Maranhão, onde consegue derrotar os portugueses com as armas da astúcia. Conta-se como verdade que, na capital maranhense, ele hasteou a bandeira britânica, em vez das cores brasileiras. Os militares que vigiavam o porto acreditaram tratar-se de um navio inglês, neutro no conflito, e enviaram ao seu encontro um brigue com mensagens de boas-vindas. Ao subir a bordo, porém, o oficial encarregado de entregar os papéis se deu conta de que estava em um navio brasileiro. Foi imediatamente preso, mas Cochrane decidiu liberá-lo com a condição de levar uma carta ao governador das armas, Agostinho de Farias, na qual exigia a capitulação da cidade. No dia seguinte, 28 de julho, a junta do governo, já ciente da aproximação das tropas brasileiras pelo interior, anuncia a adesão da província ao império do Brasil.

COCHRANE SAQUEIA A CIDADE

O escritor Laurentino Gomes, revela no livro 1822, que por não receber do governo o que havia sido acertado, “depois de obter a rendição portuguesa em São Luís, Cochrane dedica-se ao saque metódico da cidade, tomando posse de um patrimônio estimado em 100.000 libras esterlinas – cerca de quarenta milhões de reais atualmente. Incluía todo o dinheiro depositado no tesouro público, na alfândega, nos quartéis e outras repartições, além de propriedades particulares e mercadorias armazenadas a bordo de 120 navios e embarcações ancoradas no porto. Na prática, o almirante tratou a capital do Maranhão como se fosse toda ela um território inimigo conquistado. Os habitantes se revoltaram, mas, sob a mira dos canhões, acabaram forçados a aceitar suas exigências, cujos bens e   mercadorias aprendidos foram despachados para o Rio de Janeiro, onde Cochrane esperava que fossem confirmados como presas de guerra”.

COCHARANE, O AMALDIÇOADO

Laurentino Gomes diz ainda que “apesar do comportamento brutal e mesquinho em São Luís, Cochrane foi recebido no Rio de Janeiro como herói nacional e agraciado por D. Pedro com a recém-criada Ordem do Cruzeiro do Sul e o título de marquês do Maranhão – decisão que soa aos maranhenses até hoje como uma ofensa”.

Foi por conta dessa auréola de herói conferida ao almirante escocês, que levou José Sarney, no cargo de presidente da República, numa visita à Abadia de Westminister, em Londres, ao aproximar-se da tumba, onde se encontravam os restos mortais de Cochrane, a pisar sob a lápide e exclamar para espanto dos que o acompanhavam: “Corsário!”

Outra manifestação irada de maranhense contra o Lord, encontra-se no livro de Astolfo Serra, intitulado “Guia histórico e sentimental de São Luís”, com o registro desse desabafo: “Cochrane foi simplesmente isto em São Luís: um autêntico pirata! Não libertou a cidade, saqueou-a brutalmente”.

OPINIÃO DE JOMAR

Numa crônica de Jomar Moraes, publicada neste jornal em 28 de julho de 2010, intitulada “Nossa data cívica”, o saudoso escritor maranhense, depois de também criticar o Lord Cochrane, pelas suas espertezas e trapalhadas, “relativamente aos pesados tributos que sua rapinagem impôs à portuguesada capitalista da terra, pelo menos estava cobrando alto por seus assinalados serviços à consolidação do Império do Brasil, que não tinha recursos para lhe pagar”.

Em seguida, escreve categoricamente: “Que fique bem claro que não estou, de modo algum, cantando loas ao almirante, mas entendo que ele precisava pagar-se a si e aos seus comandados pelos serviços aqui prestados inegavelmente pela causa da Independência nacional”.   

Ao término da crônica, Jomar afirma: “E então o Maranhão aderiu à Independência e ainda ofereceu, a 24 de novembro, no palacete conhecido como Solar Cesário Veras, um lauto banquete ao lord, que teria comido com um lord, dançado como um lord e como um lord feito o que no Largo do Carmo por muito tempo se comentou, embora não me lembre de ninguém que no Maranhão traga em seu nome o antropônimo Cochrane”.     

sem comentário »

20 OU 28 DE JULHO A ADESÃO DO MARANHÃO À INDEPENDÊNCIA

0comentário

Em 1994, sob os auspícios da Academia Maranhense de Letras e da Alumar, o professor Mário Meireles publicou um dos livros mais importantes de sua trajetória de escritor, pesquisador e historiador: Dez Estudos Históricos.

Dentre os assuntos polêmicos, tratados na obra do respeitado professor, destaca-se o relevante ato histórico da Adesão do Maranhão à Independência, que,  em função da Lei nº 11, votada pela Assembleia Provincial em 6 de maio de 1835 e confirmada pelo Congresso do Estado, pela Lei 1.092, de 30 de abril de 1923, é comemorado equivocadamente a 28 de julho de 1823, segundo Mário Meireles.

COMEMORAÇÕES CÍVICAS

Para que a Adesão do Maranhão à Independência do Brasil fosse comemorada de modo retumbante e contasse com a participação da população, o Governo do Estado, de acordo com a lei, realizava solenidade cívica, em São Luís, no dia 28 de julho, que contava com a presença de autoridades governamentais e educacionais.

O festejado episódio histórico, em anos mais recentes, deixou de ser feriado e virou ponto facultativo, motivo pelo qual as novas gerações não sabem dizer o que aconteceu numa data tão cara para os maranhenses, que o professor Mário Meireles não nega a importância histórica do evento, mas discorda quanto ao lugar e a data em que o ato foi protagonizado.  

A RESISTÊNCIA DOS PORTUGUESES.

Depois de treze anos no Brasil, D. João VI e a família real retornam a Portugal e o filho D. Pedro I é nomeado príncipe regente do Brasil, que, como tal, anuncia a decisão de aqui permanecer e a 7 de setembro de 1822, nas margens do Rio Ipiranga, proclama a Independência do Brasil, ato que o  Maranhão e a Bahia resistem em reconhecer, porque eram províncias nas quais os portugueses tinham forte presença e não concordavam com o gesto  de Pedro I.

O clima de beligerância entre maranhenses e portugueses ganha mais consistência a partir do momento em que a Junta Provisória e Administrativa, que governava o Maranhão, presidida pelo bispo Dom Joaquim de Nazaré, desconhece a autoridade de D. Pedro e ainda presta juramento de fidelidade à Constituição de Portugal e à Casa de Bragança.   

 OS MARANHENSES EM AÇÃO

Os maranhenses com a ajuda dos independentes cearenses e piauienses, imediatamente deflagraram ações em Caxias, com o objetivo de alcançar São Luís.

A vila de Itapecuru, pela sua posição estratégica, torna-se o teatro de embates contra as forças fiéis a Portugal. A luta pelo domínio militar e político da vila ocorre de maneira aberta entre os simpatizantes do príncipe do Brasil, comandados pelo capitão Salvador de Oliveira, e os adeptos do trono lusitano, encabeçados pelos coronéis José Felix Pereira de Burgos e Ricardo José Coelho.   

As desinteligências entre Burgos e Coelho fizeram a Junta Governativa demitir o primeiro do comando geral da vila, o qual, por sua vez, abandona a causa dos portugueses e adere as tropas independentes.

AS LUTAS EM ITAPECURU

O livro do ilustre historiador Luís Antônio Vieira da Silva, intitulado História da Independência da Província do Maranhão, mostra o desfecho dessa luta: “O coronel Burgos permanecendo na vila do Itapecuru-Mirim e vendo que pela invasão das tropas indisciplinadas, a desordem e a facção passaram a ocupar os distritos onde haviam sido expulsas as tropas portuguesas, e que à sombra da independência se iam cometendo roubos e assassínios, receosos de que a anarquia tomasse conta da Província, julga prudente instalar provisoriamente os governos municipal, civil e militar naquela vila, visto achar-se cortada a comunicação com São Luís, que ainda se mantinha sujeita ao governo português.

De acordo com Mário Meireles, no dia 18 de julho de 1823, Burgos, reúne a Câmara-Geral em Itapecuru e após discutir o assunto resolve a 20 proclamar a Adesão do Maranhão à Independência do Império e jurar fidelidade a Pedro I como Imperador e Defensor Perpétuo do Brasil, sem esquecer de eleger uma Junta Provisória Independente para a Província.

Os eleitos foram José Felix Pereira Burgos, governador das Armas, Padre Antônio Pereira Pinto do Lago, secretário, Antônio Joaquim Lamagnére Galvão, Fábio Gomes da Silva Belfort e Antônio Raimundo Belfort Pereira de Burgos, ficando reservado três lugares para a capital da Província.

SOLENIDADE NO PALÁCIO

Depois de instalado o Governo de Itapecuru-Mirim, às 11 horas do dia 28 de julho, no Palácio do Governo, a Junta Provisória, proclama a Adesão do Maranhão à Independência do Brasil e procede-se a eleição para a composição do Governo Provisório.

A OPINIÃO DE MÁRIO MEIRELES 

“ Se a Câmara-Geral de São Luís, convocada para organizar o Governo Provisório da Província, houve por bem eleger os três membros, inclusive o presidente, que haviam sido reservados para a capital na Junta de Itapecuru- Mirim, ela, a câmara geral, representando a vontade do povo de São Luís, reconheceu, de fato e de direito, esse governo eleito em 20 de julho, pois que se submeteu às condições impostas e, consequentemente, à Adesão ali e nesse dia proclamada”.

O saudoso historiador encerra o polêmico assunto com esta sentença: “Por que dizer que o Maranhão aderiu à Independência do Brasil no dia 28 de julho, se desde uma semana antes existia o governo independente que, reconhecido, subsistiu depois dessa data? Consequentemente, talvez fosse mais justo comemorar-se a 20 de julho.”      

sem comentário »
https://www.blogsoestado.com/buzar/wp-admin/
Twitter Facebook RSS