Foi nos meados da década de 1960, quando o Maranhão era governado pelo escritor José Sarney, no governo do qual José Maria Cabral Marques exercia com brilhantismo e competência o cargo de secretário de Educação do Estado, que eu tive o prazer e a honra de conhecê-lo pessoalmente, de tomar conhecimento do que fazia como homem público e do formidável trabalho que realizava, como membro do primeiro escalão da nova administração, eleita em 1965 pelo povo maranhense.
Meus primeiros contatos com aquela extraordinária figura humana, aconteceram no órgão mais importante da administração pública estadual, a Sudema – Superintendência do Desenvolvimento do Maranhão, com as atribuições de planejar e acompanhar a execução dos recursos liberados para as obras governamentais.
Naquela repartição pública, onde eu prestava serviços administrativos, Cabral marcava presença com frequência, para discutir e tratar dos interesses da secretaria que comandava, construímos uma amizade sincera e sólida, a ponto de dele receber irrecusável convite para passar uma temporada na secretaria de Educação, para ajudá-lo nas ingentes tarefas impostas por aquela pesada máquina burocrática.
Anos depois, Cabral, então à frente da Secretaria de Administração, mais uma vez, lembra-se da minha pessoa e convida-me a fazer parte de um grupo selecionado, que no Rio de Janeiro, passaria um ano para participar de um curso na Escola Brasileira de Administração Pública, vinculada à Fundação Getúlio Vargas.
O grupo, constituído, dentre outros, por figuras do quilate intelectual e moral de José Joaquim Filgueiras, Artur Almada Lima (eram juízes), Mundicarmo Ferreti e José Bastos Silva, formaria o núcleo para o treinamento em São Luís dos futuros professores da Escola de Administração do Estado do Maranhão.
Os gestos de Cabral, praticados espontaneamente e com objetivos claramente confessáveis de fazer com que eu crescesse profissionalmente, ficaram indelevelmente marcados na minha alma e ao longo da vida jamais foram esquecidos, motivos pelos quais passei a ter por ele uma incomensurável admiração como homem público, onde se impôs pela retilínea conduta pessoal e moral e sem tirar proveito de qualquer natureza no desempenho das elevadas funções exercidas.
REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL
De Cabral, não esqueço a edificante e segura atuação à frente da reitoria da Universidade Federal do Maranhão, cargo que ocupou ao longo dos anos de chumbo, quando enfrentou embates aguerridos e sem tréguas, de setores docentes e discentes, contra os quais jamais usou o poder que detinha sob suas mãos, para punir ou vingar-se dos que tentavam denegri-lo ou jogá-lo no limbo da vida pública.
NA ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS
No ano 2000, quando se abre uma vaga na Academia Maranhense de Letras, para ocupar o lugar do escritor Franklin de Oliveira, os acadêmicos, por unanimidade, elegeram Cabral Marques para tê-lo como confrade e fazer parte de um sodalício que o reconhecia como figura humana de valor pelas suas qualidades profissionais e intelectuais.
O GOSTO PELA POESIA
No seu discurso de posse, na Casa de Antônio Lobo, a 6 de abril de 2001, revelou o seu gosto pela poesia, com esta informação: “Quando eu era ainda muito jovem, foi noticiado que Margarida Lopes de Almeida, iria recitar poesias no Teatro Artur Azevedo. No dia e hora anunciados, lá estava eu, de terno e gravata, sentado na primeira fila. Imaginei deleitar meus ouvidos com a declamação e os meus olhos com uma mulher jovem e bonita. Na minha imaginação ela seria bela como as musas dos poetas. Minha surpresa e desagrado vieram juntos. Uma senhora de idade, gorda trajando um modelo do início do século, entrou no palco. Minha primeira reação foi retirar-me. Não tive coragem de sair e me detive. Foi bom ter ficado. Ainda hoje recordo o êxtase que se apossou de mim. Margarida começou a recitar divinamente. De repente, todo o meu ser ficou reduzido à dimensão dos ouvidos. Não falava, estava imóvel e absorto e aprendi a respiração para não perturbar o espetáculo.”
O GOSTO PELA LEITURA.
Em outro trecho, bastante interessante de sua oração, relatou este fato: “Minha mãe, apesar do pouco tempo disponível, depois dos afazeres domésticos, lia muito. Fazia economia com o dinheiro das despesas de casa e comprava romances em fascículos. Presumo que poucas pessoas, sabem que se vendia, nesta cidade, de porta em porta, nos bairros pobres, romances em fascículos. Ela me incutiu o gosto pela leitura, contando-me histórias lendárias. Creio que ela me iniciou na literatura universal e que me fez ser encontrado muitas vezes, na minha mocidade, nesta Casa de Antônio Lobo, quando aqui funcionava a Biblioteca Pública. Com certeza, vinha guiado pela minha mão invisível de minha mãe, para ler os livros que eu não podia comprar, dentre os quais os didáticos.”
UM HOMEM DE FÉ
Sebastião Moreira Duarte, no maravilhoso discurso de saudação ao novo acadêmico, além de destacar, de maneira irretocável e brilhante, as suas atuações na cena pública e privada, evocou também atos que marcaram a sua trajetória de virtudes nobres e multifacetadas, dentre as quais a de ser um homem de fé, o que pode ser avaliado por este episódio: “Para comprová-lo, valho-me apenas do que sejam fatos recentes ou habituais em sua biografia, dispensando-me de trazer à nossa presença aquele rapagote que, envergonhado por não haver mais missa em dia de Sexta-Feira Santa, cobrou maior coerência à própria convicção e passou a vestir batina como coroinha nas procissões religiosas de São Luís, sem de incomodar o que dissessem seus companheiros. Também não precisarei tirar do baú de relembranças a foto do ajudante de missas dos frades capuchinhos ou, mais tarde, a do acólito de Dom José Delgado. Ou a do congregado mariano, do delegado da Juventude Universitária Católica, do presidente do Movimento Familiar Cristão.”