O falecimento de Gerd Plhueger, na semana passada, em São Luís, permite-me fazer algumas observações sobre o colunismo social que os jornais maranhenses adotaram, ontem e hoje.
Na condição de militante da imprensa maranhense e por acompanhar a sua história no correr dos últimos tempos, atrevo-me a discorrer a respeito de um tipo de jornalismo que vicejou e brilhou na mídia impressa de São Luis e ainda permanece em cena, mas nada igual ao da época de Gerd Plhuger.
Compulsar os jornais que circulavam em São Luis dos anos 20, 30 e 40 do século passado, além de ser um bom exercício intelectual, serve para mostrar, por exemplo, como naqueles remotos tempos, os periódicos de nossa terra já praticavam um arremedo de colunismo social, mas despojado de rebuscamentos, intenções e objetivos que, anos depois, nele foram injetados.
Nos jornais do começo do século XX, são bem visíveis os espaços que as redações reservavam à veiculação de informações de cunho social. Só que eram registros simples de efemérides e de datas relativas às comemorações de nascimentos, batizados, aniversários, noivados, casamentos, bem como de partidas e chegadas de figuras importantes do meio social, em viagens de navios, com destino ao Rio de Janeiro e, em menor escala, ao exterior. A responsabilidade pela veiculação da informação era da direção do jornal, que assim procedia com o fito de prestigiar os anunciantes e as autoridades.
No Maranhão, esse tipo de informação jornalística, de caráter essencialmente social, só começa a mudar na forma e no conteúdo, a partir da segunda metade da década de 1950, com o aparecimento no Rio de Janeiro de uma novidade que dois jornalistas, pouco conhecidos, levaram para as redações dos jornais em que bisonhamente trabalhavam – O Globo e Última Hora .
Graças a Ibrahim Sued e Maneco Muller, que virou Jacinto de Thormes, os jornais a que pertenciam acataram e adotaram o filão que inventaram e batizado de colunismo social.
O colunismo social fazia um tipo de jornalismo alternativo, refinado e voltado para realçar os eventos sociais, nos quais pontificavam personalidades privilegiadas e da alta sociedade. Por meio dessa inovadora ferramenta jornalística, os homens e as mulheres de posses conquistaram notoriedade nacional, brilhavam e se faziam notados e cortejados. As figuras femininas eram as mais realçadas e divulgadas pelos colunistas sociais, que exaltavam os dotes físicos que ostentavam, mas sem esquecer os vestidos, sapatos, jóias, penteados e outros penduricalhos, que, reverberados pelos meios de comunicação, viravam modismos e se tornavam objetos de desejo e de consumo.
Com a visibilidade projetada na sociedade, por ação dos colunistas sociais e dos meios de comunicação, a granfinália ganhou corpo, conquistou status e incorporou neologismos, que expressavam uma nova forma de viver. Incrivelmente, tais neologismos caíram no gosto popular.
O fabuloso sucesso do colunismo social, especialmente no Rio de Janeiro, então centro polarizador do modismo nacional, fez crescer a circulação e a venda dos jornais, em cujas páginas o leitor via desfilar os ricos e poderosos e ter conhecimento de um mundo sofisticado até então fechado e inacessível.
Nos estados, onde os jornais provincianos pontificavam à custa da politicalha, com o advento do colunismo social, a situação reverteu-se. Em São Luis, nos meados da década de 1950, circulavam seis periódicos: O Imparcial, Jornal do Povo, Jornal do Dia, O Combate, Jornal Pequeno e Diário Popular. Desses, apenas três – Jornal do Povo, O Imparcial e Jornal do Dia – se sensibilizaram com o colunismo social e nele viram a fórmula de alavancar as tiragens diárias e de sintonizá-los com o jornalismo praticado nos centros mais adiantados.
Salvo melhor juízo, o Jornal do Povo foi o pioneiro nessa iniciativa, a ponto de transformar o então repórter Benito Neiva em colunista social. Fã de Jacinto de Thormes, procurava imitá-lo até na maneira de vestir-se: roupa black-tie e o inseparável cachimbo. A coluna fez sucesso, mas Benito, como jornalista, ficou longe do ídolo. Com o fechamento do Jornal do Povo, em abril de 1964, por força do regime militar, Benito mudou-se para o Estado do Maranhão, onde não conseguiu reeditar o sucesso do matutino de Neiva Moreira.
Para se enquadrar à modernidade que imperava na imprensa nacional, O Imparcial, também, engajou-se no projeto e usou a prata de casa, Maria Inês Saboya, para assumir o posto de colunista social. Surgiu com o pseudônimo de Christine. Anos depois assumiu a verdadeira identidade e manteve a coluna enquanto durou e teve saúde. A colunista de O Imparcial não se projetou só pelo que comunicava, mas por ser uma figura humana caridosa, humilde e correta.
O Jornal do Dia foi outro que não ficou à margem dessa inovação jornalística. Alguns jornalistas foram convocados a assumir a titularidade da coluna social do JD. Um deles, o irreverente cronista caxiense Vitor Gonçalves Neto. O perfil de colunista social passou longe dele. Pela maneira debochada de escrever e do tratamento dispensado à elite maranhense, fez o jornal perder mais leitores do que ganhar. Só deixou de criar problemas à direção do JD ao ser mandado de volta a Caxias.
Para substituir Vitor Gonçalves Neto, o Jornal do Dia encontrou um jovem, inteligente, sagaz e versátil, chamado Gerd Pflueger. Criou a coluna Passarela e através dela conquistou setores da sociedade, com os quais, muitas vezes, promovia eventos beneficentes. Para ajudá-lo na tarefa de escrever Passarela, contou com a parceria de Maria de Lourdes Tajra, que dele se fez esposa e com a qual realizou inúmeras campanhas em prol de entidades filantrópicas.
Também incursionaram no colunismo social maranhense, figuras bissextas, da expressão de Lucy Teixeira, Genu Moraes, Genoveva Ayres, Porfírio Serra de Castro, Mary Magalhães, Maria Bogéa, Janete Trinta, Irtes Cavanhak, Flor de Liz, Mário Lincoln, Ribamar Silva. Nem todos conseguiram firmar-se nessa atividade jornalística. Os que continuaram no colunismo social, não chegaram a brilhar. Ficaram no arroz com feijão até tirarem o time de campo.
Depois daquela fase áurea, o colunismo social em São Luis murchou e só voltou a ganhar relevo e prestígio no final dos anos 1960, com o aparecimento de um jovem interiorano de Presidente Dutra, que com perseverança e talento, engajou-se no jornalismo maranhense e escolheu o colunismo social para projetar-se e conquistar rapidamente um lugar ao sol numa área que já parecia decadente, mas por ele transformada e renovada. Consolidou-se de tal forma na profissão que até hoje brilha no jornal que abraçou. Seu nome: Pergentino Holanda.
Começou no colunismo social, algumas vezes, substituindo interinamente Maria Inês, em o Imparcial; em outras oportunidades, ocupou o lugar de Gerd Pflueger, em Passarela, no Jornal do Dia. De tanto substituí-lo, acabou ficando definitivamente no posto.
PH, assim se tornou conhecido, é o mais brilhante, o mais culto e o mais competente dos colunistas sociais, vivos ou mortos, que São Luís teve. Não é à toa que continua – quase 50 anos – na atividade jornalística, sendo o mais lido e prestigiado da cidade. Ao longo desse tempo, impôs-se de tal modo no colunismo social do Maranhão e do Brasil que virou figura nacional. Como um Rei Midas, com competência e talento, faz e promove belos, alegres, fulgurantes e inigualáveis eventos sociais.
PH, nos dias correntes, não tem mais o charme de colunista social. Os anos o transformaram num jornalista polivalente. Em atividade, é o mais longevo da imprensa maranhense. Essa longevidade biológica e profissional, contudo, pode ser a causa de um problema que afeta a sua comunicação com o leitor: a acomodação. Esse comportamento o impede de correr atrás da notícia. Ele acha que a notícia é que tem de chegar a ele, por ser um jornalista famoso. Não é de hoje, como seu amigo e admirador, que venho chamando a sua atenção para isso. Ele precisa entender que vivemos a avassaladora época da internet, em que os fatos são tantos, variados e simultâneos que chegam a nos atropelar. Mais ainda: jornalista de hoje, por mais que não queira, tem de ser um pouco blogueiro. Essa turma, cada vez mais numerosa e de olho no faturamento, vem atuando no mercado da comunicação, alguns bem intencionados, outros, nem tanto, com tamanho desembaraço, que o acontecimento chega rapidamente ao conhecimento público, deixando-o bem informado sobre o que se passa no dia a dia da cidade. Quem assim não proceder, dança.