Neste começo de abril, vou participar como convidado de vários eventos para debater o movimento militar, começado a 31 de março de 1964 e findo em 15 de março de 1985, quando o maranhense José Sarney, eleito vice-presidente da República, por voto indireto do colégio eleitoral, assumiu o comando do País, ante a impossibilidade do presidente eleito, Tancredo Neves, por motivo de saúde, achar-se hospitalizado, em Brasília.
A minha presença nesses eventos, sem dúvida alguma, deve-se precipuamente ao fato de ser um protagonista, no Maranhão, de um lamentável episódio histórico, em que o movimento militar, a pretexto de combater a subversão e a corrupção, praticou atos e injustiças escabrosas contra homens e mulheres, que lutavam por um País melhor, onde o desenvolvimento sócio-econômico e a democracia fossem prioridades de governo.
Participei daquele lamentável episódio, por me encontrar no exercício do mandato de deputado estadual, eleito no pleito de outubro de 1962, como integrante do Partido Social Progressista e inserido no grupo político das Oposições Coligadas.
Elegi-me, à época, com pouco mais de dois mil votos, quase todos obtidos na cidade em que nasci: Itapecuru-Mirim. Enquanto a bancada governista, era composta de 27 parlamentares, a oposicionista tinha apenas 13. Pela expressiva vantagem numérica da bancada do governo, que obedecia cegamente ao governador Newton de Barros Bello, ver-se-á as dificuldades dos oposicionistas para suplantarem e combaterem os situacionistas.
A despeito de sermos significativamente minoritários, o bloco oposicionista não se submetia ou ficava retraído diante do chamado rolo compressor palaciano, que funcionava para aprovar tudo do interesse do Executivo, qualquer que fosse a matéria.
Dizia-se á época, e os jornais estão aí para comprovar, que a bancada oposicionista, correspondente à legislatura 1962 a 1966, era aguerrida e combativa, porque nela figuravam três jovens parlamentares: Sálvio Dino, Benedito Buzar e Ricardo Bogéa, este, suplente do PDC, mas sempre convocado para atuar no plenário. A imprensa também dizia que os jovens deputados, além do sistemático combate ao governo vitorinista, fazia a diferença por conta dos pronunciamentos e das propostas apresentadas, sempre ditadas através de linguagem renovadora, dinâmica e recheada de conteúdo compatível com os tempos que o Brasil vivia e exigia mudanças e reformas em suas estruturas políticas, sociais e econômicas.
Com esse desiderato e atuando sem temer as represálias governistas, que passamos a incomodar a chamada maciça palaciana, que a todo custo procurava perturbar os nossos protestos e impedir que as iniciativas por nós apresentadas fossem discutidas ou aprovadas, especialmente com respeito às reformas de base estavam na ordem do dia.
Durante todo o mês de março de 1964, quando as forças pró e contra as medidas reformistas propostas pelo presidente João Goulart, no Congresso Nacional, estavam em discussão e comentadas pela mídia, nós, também transformamos a Assembleia Legislativa num fórum de debates, focando matérias consideradas importantes e inadiáveis ao crescimento do País.
As discussões em torno dessa problemática conduziram a nação brasileira ao estágio de uma terrível agitação e radicalização, que desaguou na divisão da sociedade e das forças políticas, disso resultando a destituição do presidente João Goulart e a tomada do poder pelos militares, para evitar que o Brasil “seguisse os passos de Cuba e se tornasse comunista”, segundo a concepção dos segmentos reacionários.
O desfecho da crise foi o desencadeamento no País de uma miríade de atos arbitrários e de medidas ditatoriais, que redundaram no esmagamento das liberdades democráticas, na supressão das garantias individuais e revogação do estado de direito.
No Maranhão, tão logo essas medidas foram decretadas no plano federal, os militares aqui sediados, coadjuvadas pela Polícia Militar, começaram a caçar os suspeitos de apoiar o governo deposto. Assim, sindicatos e entidades estudantis foram invadidos e fechados, bem como numerosas prisões se efetuaram, sendo os presos conduzidos para o quartel do 24º Batalhão de Caçadores e submetidos a interrogatórios e inquéritos, todavia, sem o emprego da violência ou da tortura.
Foi nesse cenário de terror e de vingança que as autoridades estaduais se aproveitaram para se livrar daqueles jovens deputados que os atormentavam. Com a cassação dos mandatos de deputados federais e de senadores, os palacianos passaram a conceber uma fórmula para nos expurgar do plenário da Assembleia.
Por um lado, pediam aos comandos militares os nomes dos deputados estaduais que deveriam ser cassados, pela prática de atividades extremistas. Por outro, através de seus sicários, preparavam um projeto de resolução ilegal e afrontoso ao regimento da Assembleia Legislativa e à Constituição.
No dia 25 de abril de 1964, com o teatro das operações no ponto de nos expulsar da vida pública, os deputados estaduais, intimidados e pressionados, votaram o famigerado projeto de resolução, tomando por base um radiograma do IV Exército que apontava como comunistas: eu, Sálvio Dino e os suplentes José Bento Neves, Vera Cruz Marques, Joaquim Mochel, Bandeira Tribuzi e William Moreira Lima