Dias atrás, foi amplamente divulgado o sumiço da caneta de ouro do Museu da República, no bairro do Catete, no Rio de Janeiro, que pertenceu ao ex-presidente Afonso Pena. Tem a forma de pena de ave e ornamentada com ramo, possui uma pequena placa e um trevo com três folhas e três brilhantes.
Para nós, maranhenses, a caneta tem um significado precioso e histórico. Foi com ela, que o então presidente Afonso Pena, em dezembro de 1907, portanto, há 106 anos, assinou um ato de extrema relevância para o Maranhão.
Afonso Pena, salvo melhor juízo, foi o único presidente do Brasil a vir ao Maranhão na chamada Velha República, ou seja, no período de 1889 a 1930.
Foi uma visita longa e exaustiva e ele cumpriu uma programação que começou em São Luis, em julho de 1906, e terminou em Timon. No Maranhão, passou dez dias e saiu daqui convencido de que era necessária e imperiosa a construção de uma obra ferroviária, destinada ao escoamento da produção econômica e facilitar a comunicação entre cidades do vale do Itapecuru.
A história dessa ferrovia, tão reclamada pelas classes produtoras do Estado, teve início em 1903, por um documento da Associação Comercial do Maranhão e encaminhado ao senador Benedito Leite. O documento, precioso e detalhado, com plantas, orçamento e topografia, formava um projeto da autoria do competente engenheiro Palmério Cantanhede, que, se materializado “evitaria a continuada paralisação do comércio e os prejuízos relevantes da lavoura, devido ao encalhe de toda flotilha fluvial e da obstrução completa do rio Itapecuru”.
De posse daquela rica documentação, Benedito Leite tomou três iniciativas: 1) pronunciou brilhante discurso no Senado acerca da necessidade da obra; 2) levou o projeto ao conhecimento do ministro de Viação e Obras Públicas, Osório de Almeida, que manifestou irrestrita solidariedade à reivindicação das classes produtoras do Maranhão; 3) com o apoio dos senadores Gomes de Castro e Belfort Vieira, apresentou ao Congresso Nacional projeto de lei, que autorizava o Governo Federal a construir a estrada de ferro São Luis-Caxias e contratar “a quem apresentar melhores vantagens, devendo ser a estrada, depois de construída, arrendada mediante concorrência pública, ou fazendo a obra por administração”.
Depois de dois anos de muita luta, Benedito Leite viu o projeto aprovado pelo Congresso Nacional no dia 3 de janeiro de 1905 e transformado em Lei nº 1.329, mercê da sanção do presidente Rodrigues Alves.
Em 1906, Benedito Leite deixou o Senado para ocupar o cargo de governador do Maranhão, no exercício do qual continuou a batalha pela construção da ferrovia, que, sem ela, de acordo com o estudo do engenheiro Palmério Cantanhede, “o Maranhão estaria ameaçado de ficar sem porto, sem vias de transporte, por conseguinte, sem comércio e sem renda para o Tesouro”.
À frente do governo do Estado, Benedito Leite convidou o presidente Afonso Pena para visitar o Maranhão. O maranhense teve papel importante no lançamento da candidatura do político mineiro à presidência da República, tanto que recebeu convite para assumir o Ministério da Agricultura, ato que não vingou por divergir do caudilho gaúcho, Pinheiro Machado.
O chefe da Nação aceitou o convite, pois acompanhou com extremo interesse, a luta do senador maranhense, em prol da construção da estrada de ferro São Luis-Caxias, cidade que já estava conectada a Cajazeiras, depois Flores, hoje Timon, por uma via férrea com a extensão de 78 quilômetros, inaugurada em 1895.
O presidente da República desembarcou em São Luis a 5 de julho de 1906 e aqui passou três dias, sendo alvo de expressivas homenagens das autoridades estaduais, municipais, dos setores civil e militar. Também visitou repartições públicas, instituições religiosas, culturais, educacionais e empresariais.
No dia 8 de julho, embarcou no vapor Barão de Grajaú, na companhia do governador Benedito Leite e de ilustrada comitiva, com destino a Caxias.
Durante sete dias, singrou pelo vale do Itapecuru, para ver ao vivo e de perto as más condições de navegabilidade do rio e da premente necessidade da estrada de ferro. Antes de chegar ao destino final da expedição, o presidente da República fez escalas nas cidades de Rosário, Itapecuru, Coroatá e Codó e Caxias. Em todas elas, recebeu efusivas homenagens das autoridades e do povo.
A excursão de Afonso Pena ao Maranhão foi proveitosa e de resultados satisfatórios, pois ao chegar ao Rio de Janeiro, então capital da República, tratou de providenciar ações para transformar em realidade o sonho do amigo Benedito Leite e dos maranhenses. Em dezembro de 1907, ele autorizou a abertura da concorrência para execução da obra, que, ao longo do tempo, sofreu interrupções, sobressaltos e prejuízos, em função das constantes alterações no traçado e no orçamento do projeto.
A São Luís-Caxias, concluída em 1920, foi inaugurada em março de 1921, com o nome de Estrada de Ferro São Luis-Teresina. A ela incorporou-se a Caxias-Timon e a ponte ligando a ilha ao continente, graças a Lino Machado, que, no Congresso Nacional, continuou a defender o pensamento de Benedito Leite e os interesses do Maranhão.
Em tempo: o vapor Barão de Grajaú fez uma parada programada, em plena noite, num trecho do rio Itapecuru, para o presidente da República praticar um ato inédito: capturar e matar jacarés. Nos dias de hoje, a cabeça de Afonso Pena seria pedida pelos ecologistas.