A Assembleia Legislativa realiza amanhã solenidade especial para comemorar o Dia do Poder Legislativo no Maranhão. Na programação, um ato que diretamente diz respeito a este escriba e a Sálvio Dino: a devolução de nossos mandatos de deputado estadual, conquistados livre e democraticamente nas eleições de outubro de 1962.
Esses mandatos, menos de dois anos depois, ou seja, em abril de 1964, foram de nós extorquidos por uma trama política, articulada nos gabinetes do Palácio dos Leões. A conspiração palaciana visava tirar do plenário do Poder Legislativo os parlamentares atuantes, que lutavam contra o domínio do grupo político, que estava no poder desde a redemocratização do país, em 1946.
Feito este preâmbulo, vamos aos fatos que culminaram na cassação dos mandatos. Os primeiros sinais indicativos de que na Assembleia Legislativa do Maranhão estava em curso um plano sinistro contra os deputados progressistas, vieram à tona após a edição do Ato Institucional nº1, de 09-04-1964, atribuindo ao Presidente da República a prerrogativa da cassação de mandatos políticos, justamente para evitar que o revanchismo e as vinganças políticas recaíssem sobre os que lutavam contra os régulos regionais e municipais.
Em confronto com a legislação revolucionária, os deputados estaduais da base governista, de maneira insólita e açodada, resolveram votar e aprovar no dia 16 de abril de 1964, um Projeto de Resolução, que avocava para a Assembleia Legislativa o direito de cassar mandatos de prefeitos e membros dos corpos legislativos estaduais e municipais.
Em ação simultânea, o Palácio dos Leões expede cabograma, assinado pelo presidente da Assembléia, deputado Frederico Leda, ao general Justino Alves Bastos, comandante do IV Exército, com este teor: Solicito Vossa Excelência se digne dar conhecimento esta Assembléia Legislativa nomes deputados e suplentes incluídos relação comunistas ou incursos parágrafo primeiro artigo sétimo Ato Institucional para as providências necessárias cumprimento diretivas movimento revolucionário do qual Vossa Excelência constitui firme esteio e um dos mais dignos fiadores.
O cabograma, transmitido sigilosamente e sem que a maioria dos deputados soubesse da sua expedição e do seu texto, revelava que se achava em articulação uma operação premeditada e ardilosa. O que faltava para materializar aquela tenebrosa ação acontece a 24 de abril. Nesse dia, o general Justino Alves Bastos encaminha diretamente ao comandante da Guarnição federal, coronel Rivas de Carvalho Lima, a resposta ao cabograma do presidente da Assembleia Legislativa, vazada nos seguintes termos: Conforme ordem IV Exército deveis tomar providências junto Legislativo Maranhão quanto cassação mandatos deputados comunistas Sálvio Dino, Benedito Buzar, Joaquim Mochel, Vera Cruz Marques, agitadores, e se for o caso, Ricardo Bogéa.
Para tomarem conhecimento desse cabograma, o comandante da Guarnição federal, coronel Rivas, convoca os deputados Frederico Leda, presidente do Poder Legislativo, e os líderes da maioria e da minoria, deputados Pereira dos Santos e Manuel Gomes. A eles, foi também comunicado que os suplentes de deputado, Bandeira Tribuzi e William Moreira Lima, por serem comunistas confessos, e José Bento Neves, na condição de agitador, estavam presos e, por isso, deveriam ser cassados.
O documento, recebido como denúncia, fez o deputado Frederico Leda convocar extraordinariamente a Assembléia e encaminhar representação à Comissão de Justiça, para a mesma se pronunciar a respeito da matéria.
A Comissão não perde tempo e oferece este parecer sobre o cabograma do IV Exército: Bem examinada a representação em referência entendemos recebê-la por estar amparada em legislação vigente deste Poder Legislativo. Realmente, as atividades exercidas pelos senhores deputados e suplentes e que ensejaram a provocação desta proposição, foram constatadas pelo Comando do IV Exército, através da 10ª Região Militar e do Comando da Guarnição federal de São Luís, os quais, no nosso entender, são fontes dignas do maior crédito.
Com base no parecer da Comissão de Constituição e Justiça, os deputados aprovaram o projeto de Resolução nº 17, declarando a perda dos mandatos dos deputados Sálvio Dino e Benedito Buzar, por exercício de atividades comunistas, os suplentes Joaquim Rodrigues Mochel, Manoel Vera Cruz Marques, William Moreira Lima, José Tribuzi Pinheiro Gomes, também por atividades comunistas e do suplente José Bento Neves pela prática de atos subversivos.
A Comissão de Justiça poupou o mandato do deputado Ricardo Bogéa, usando como pretexto o cabograma do IV Exército, que dava à Assembléia o arbítrio de cassá-lo ou não, baseado na expressão “se for o caso”.
Concretizados os procedimentos da cassação, no dia 25 de abril, em sessão especial, a Assembléia Legislativa reúne-se para decretar, irreversivelmente, a sorte dos parlamentares apontados pelos militares como “comunistas e agitadores”.
Aberta a sessão, e com as galerias lotadas, falaram os deputados Manoel Gomes, Ricardo Bogéa, Santos Neto, Baima Serra, Bernardo Almeida e Pereira dos Santos. Os quatro primeiros elogiaram a atuação dos parlamentares e lamentaram os procedimentos adotados pela Assembléia para extirpá-los da vida política. Os dois últimos fizeram questão de ressaltar o acerto da denúncia dos militares contra os deputados maranhenses, que não deixava margem quanto às injunções ou interferências políticas no processo de cassação. Por fim, Sálvio Dino e Benedito Buzar pronunciaram-se para apresentar as suas despedidas, relatar os compromissos políticos assumidos com o povo maranhense e lamentar que a Assembléia tenha se envolvido por maquinações políticas interessadas em afastá-los injustamente da cena pública.
O projeto foi aprovado por 27 deputados. Não compareceram à reunião, portanto, deixaram de votar os deputados Nunes Freire, Antônio Dino, Raimundo Bogéa, Sandes Macedo, Mário Flexa, Telemâco Ribeiro e Emilio Biló Murad. Após a sessão, alguns deputados depositaram nos ombros dos cassados copiosas lágrimas, como se elas os livrassem dos estigmas da pusilanimidade e da fraqueza moral, que passaram a carregar pelo resto da vida.
Sálvio e Buzar, depois de cassados, impetraram mandado de segurança contra o ato ilegal e arbitrário da Assembléia Legislativa. Através de peça jurídica indiscutivelmente notável e lúcida, o autor, professor Antenor Bogéa, expôs as transgressões praticadas contra expressos dispositivos da Constituição do Estado e do Regimento Interno. O Tribunal de Justiça não julgou o processo por considerar-se incompetente.
Prezado Buzar,
Li com bastante interesse o texto que resgata esta página negra da história do nosso querido Maranhão, intitulado “Quarenta e nove anos depois”.As injustiças perpetradas pelos donos do poder à época retratam somente o carater da maioria dos políticos que conquistam através do voto popular um posto nas casas legislativas brasileiras, para depois voltar as costas a quem os elegeu. Hoje, assim como ontem, a grande maioria desses senhores ajoelham-se diante dos poderosos do executivo e cometem qualquer coisa que lhes for determinado. Triste sina, a nossa! Gostaria que discorresse sobre a atuação do Deputado Ariston Costa e quais as razões da sua cassação á época.
Finalmente Dr. Buzar, o Sr. agraciou seus leitores com os detalhes da cassação de seu mandato de deputado de estadual, fato este narrado com uma certa “angústia” e de forma resumida nas páginas de sua memorável obra “O vitorinismo”.