Em política, a unanimidade é algo muito difícil. No Maranhão, porém, pode-se afirmar, sem qualquer temor de equívoco, que um político passou pela cena pública e conseguiu a unanimidade: Henrique de La Rocque Almeida.
Essa façanha, louvada e cantada por correligionários, adversários e os que o conheceram, decorre de sua personalidade multifacetada, com destaque para estes atributos: conduta moral irrepreensível, caráter firme e retilíneo, probidade inquebrantável, seriedade no trato com a coisa pública, modo inconfundível de tratar as pessoas e educação refinada. Tais atributos, carregados ao longo de toda a vida, fizeram dele um homem incomum, inconfundível, respeitado e conceituado. Aqui e alhures.
Nascido em São Luís, a 8 de agosto de 1912, completaria cem anos na quarta desta semana. Filho do comerciante Marcelino Gomes de Almeida Júnior e de Marieta de La Rocque Almeida, bem jovem toma a decisão de trocar o Maranhão pela Bahia. Em Salvador, faz o curso ginasial no Colégio Antônio Vieira. Em seguida, muda-se para o Rio de Janeiro e ingressa na Faculdade de Direito, diplomando-se bacharel.
Em 1934, com 22 anos, é aprovado em concurso para técnico do Ministério da Fazenda, sendo imediatamente convocado para chefiar o Departamento da Câmara de Reajustamento Econômico. Seus conhecimentos jurídicos e a projeção no Ministério da Fazenda chegaram ao conhecimento do presidente Getúlio Vargas, que o convida para presidente do Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Comerciários – IAPC.
Nesse cargo, que exerce de 1951 a 1953, firma-se como homem público devotado e impôs-se, com sabedoria e tolerância, no encaminhamento das questões políticas e administrativas. No IAPC, desenvolve um bem-sucedido plano, com prioridade para a construção da casa própria para os comerciários brasileiros. Amigo e admirador de jornalistas e artistas, fez instalar, no Rio de Janeiro, as Casas dos Artistas e da Comerciária. Empenha-se também na melhoria e ampliação da situação médico-hospitalar do órgão, construindo várias unidades hospitalares em todo o país.
Mesmo privando da amizade do presidente Getúlio Vargas, deixa o cargo para concorrer às eleições de deputado federal em 1954, no Rio de Janeiro, pelo Partido Social Progressista. Fica na suplência, mas assume o mandato parlamentar, de junho a outubro de 1957.
No Maranhão, La Rocque surge para vida pública em 1951, por ocasião do movimento popular contra a posse do governador Eugênio Barros. Integrando uma comitiva de maranhenses, radicados no Rio de Janeiro, mas com influência no cenário político e administrativo do país, vem a São Luís, onde participa de reuniões com líderes oposicionistas, em busca de alternativas para a pacificação política do Estado.
Com a morte do senador Clodomir Cardoso, a 31 de julho de 1953, surge a necessidade da realização de eleição, considerando que o suplente, padre Constantino Vieira, renunciara ao posto.
O TSE marca o pleito para 29 de novembro daquele ano. O presidente Getúlio Vargas, através do ministro da Justiça, Tancredo Neves, indica La Rocque candidato ao Senado para evitar disputas políticas. Os governistas negaram-lhe apoio, sob o argumento de ser ele simpático à causa das Oposições Coligadas. Estas, então, resolvem lançá-lo à vaga de Clodomir Cardoso. Com a máquina governista ajustada na prática da fraude eleitoral, os vitorinistas liquidam as pretensões de La Rocque chegar ao Senado, sendo derrotado por Antônio Carvalho Guimarães.
Resolve continuar na política maranhense, filiando-se ao Partido Trabalhista Brasileiro, do qual se desliga em 1957. Convidado por Clodomir Millet e Neiva Moreira, ingressa no Partido Social Progressista, pelo qual concorre às eleições de 1958, para a Câmara de Deputados, sendo o mais votado da legenda. O bom desempenho parlamentar garante-lhe a reeleição, em 1962. Nessa legislatura, e com o prestígio em alta, elege-se segundo secretario da Mesa Diretora da Câmara.
Em abril de 1964, empresta apoio ao movimento militar que derruba o presidente João Goulart do poder, mas não concorda com as injustiças por ela praticadas, que culminavam em cassações de mandatos parlamentares e prisões de lideranças sindicais e populares. Foi dos primeiros a defender os asilados nas embaixadas e perseguidos pelo novo regime. Com coragem e fé na Justiça, numa época em que a intolerância e a iniqüidade caminhavam de mãos juntas, consegue a liberdade para numerosos presos políticos.
Nas eleições de 1966, mais uma vez, concorre à Câmara de Deputados. Só que pela Aliança Renovadora Nacional, pois com a decretação do Ato Institucional nº 2, de outubro de 1965, os partidos políticos são extintos. Nessa legislatura, seu prestígio no Congresso Nacional cresce a ponto de ocupar um dos cargos mais importantes da Mesa da Câmara: a primeira secretaria.
Em 1970, uma grande cisão ocorre na Arena maranhense. O senador Clodomir Millet rompe com o governador José Sarney, nas proximidades das eleições para a renovação de dois terços da bancada maranhense, no Senado. Amigo fraternal de Millet, La Rocque, por lealdade, fica do seu lado.
Dividida, a Arena vai para a convenção. De um lado, Sarney, apoiando a candidatura de Alexandre Costa. De outro, Millet e o vice-governador Antônio Dino, dando apoio a La Rocque. A disputa foi dramática, mas, no final, Alexandre vence. Mesmo amargurado, disputa as eleições de novembro de 1970 para a Câmara dos Deputados, onde exerce a presidência da Comissão de Redação da Câmara.
Quatro anos depois daquela calorosa disputa, entre os grupos de Sarney e de Millet, realizaram-se novas eleições para a renovação de um terço da representação do Senado. Clodomir Millet não concorre ao pleito de 1974, cedendo o lugar a La Rocque, agora, apoiado pelo grupo de Sarney. As oposições, em reconhecimento ao valor do candidato e em homenagem à luta por ele travada, nas instâncias do Poder Judiciário, para libertar os presos políticos, não indicaram candidato a senador.
La Rocque recebe consagradora votação, assumindo o mandato de senador em 1975, sendo membro efetivo das Comissões do Distrito Federal, de Finanças e de Legislação Social, e vice-presidente da Comissão de Educação e Cultura.
Foi um exaltado defensor da anistia para os punidos por motivos de intransigência política, tornando-se membro da Comissão Mista do Congresso, encarregada de examinar o projeto de anistia do governo, aprovado em agosto de 1979.
Com a extinção do bipartidarismo, em novembro de 1979, e a conseqüente reformulação partidária, filia-se ao Partido Democrático Social, que apoiava o governo. Nessa agremiação partidária, encerra suas atividades políticas, todas elas marcadas pela seriedade, lealdade, honestidade e coerência.
Renuncia ao mandato de senador em 1980, para assumir o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União, nomeado pelo presidente João Figueiredo. No Senado, seu nome obteve aprovação unânime, merecendo do então líder do Partido Movimento Democrático Brasileiro, a observação de que era “a única expressão de unanimidade.”
Faleceu no Rio de Janeiro, a 16 de agosto de 1982, e deixou viúva Maria Amélia de La Rocque Almeida, com a qual contraiu matrimônio em 1949.