MARIA MACHADÃO E MAROCA

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MARIA MACHADÃO E MAROCA
BENEDITO BUZAR
Extraída do romance “Gabriela Cravo e Canela”, de Jorge Amado, a TV Globo relança, com adaptação de Walcyr Carrasaco, a novela “Gabriela”, que tanto sucesso fez em 1975.
Um dos pontos altos do folhetim é o Bataclan, cenário de uma pensão de prostitutas, na cidade baiana de Ilhéus, onde políticos, fazendeiros, exportadores e comerciantes de cacau, todas as noites se reúnem para beber, gastar e fazer sexo.
Quem viu a primeira versão de “Gabriela” ou a ora apresentada pela TV Globo, com certeza, há de lembrar os dias de glória da Zona do Meretrício, localizada principalmente nas ruas 28 de Julho e da Palma. Era ali, em pleno Centro Histórico de São Luís, que negociantes, políticos, notívagos e boêmios acorriam em busca de entretenimento e das então chamadas “mulheres da vida fácil”, para a prática nem sempre sadia do sexo.
Quando a cidade ainda não oferecia casas de diversão noturna, naquele pedaço de chão, não tão espaçoso, mas deveras movimentado, uma mulher reinava absoluta e de modo incontestável: Maria Ramalho Pestana, conhecida por Maroca, a versão maranhense da Maria Machadão. Dona da principal e mais procurada pensão da Zona do Meretrício, era cortejada pelo mundo masculino por ter sob seu domínio as mais requintadas e cobiçadas prostitutas.
Maroca chegou a São Luís em 1935, vinda de Pedreiras, sua terra natal. Com 17 anos, sem a virgindade e incompreendida pelos familiares, buscou a Zona do Meretrício para sobreviver. Hospedada na Pensão da Honorina, atraiu a clientela masculina, pela formosura, juventude e faceirice.
A venda do corpo lhe deu projeção e poupança. Em 1941, tornou-se dona de pensão ao comprar o modesto cabaré de Chiquinha Navalhada, que transformou num dos bordéis mais animados e galantes da Rua 28 de Julho, logo batizado de Pensão da Maroca, em homenagem à nova madama da Zona do Meretrício da capital maranhense.
Na época da guerra, por injunções de defesa do hemisfério ocidental, os americanos instalaram em São Luís, no Tirirical, uma forte base militar. Os soldados ianques aqui sediados afluíam em massa à Zona do Meretrício, onde, com os valorizados dólares, remuneravam fartamente as mulheres. A pensão da Maroca era a preferida dos militares americanos, que nela encontravam boa acolhida da parte das prostitutas e da dona do cabaré. A dolarização do sexo levou a Zona do Meretrício ao apogeu e melhorou sensivelmente a vida dos que dela faziam parte.
O fato de a Pensão da Maroca ser a mais conhecida e procurada pela clientela endinheirada, fez com que a dona do estabelecimento selecionasse melhor as suas hóspedes, exigindo que se apresentassem com visual mais apurado e passassem por exames corriqueiros de saúde, para não se tornarem transmissoras de doenças venéreas. As selecionadas, com direito à alimentação e moradia, obrigavam-se ao cumprimento das regras da casa e às exigências da proprietária.
Em assim procedendo, Maroca fez nome na praça, ganhou prestígio, dinheiro e transformou o promíscuo ambiente da Zona do Meretrício. Os homens que freqüentavam a sua pensão sabiam que lá não havia lugar para bagulhos ou rameiras, daí porque compareciam bem apresentados. Alguns não relaxavam o paletó e a gravata. Brigas e confusões praticamente não existiam.
A clientela, formada em grande parte por figurões importantes da política e do empresariado, aumentou em qualidade e quantidade, tanto que obrigou Maroca a expandir os seus negócios. Com as polpudas reservas provindas do mercado sexual, ela não pensou duas vezes: instalou outra pensão, também na Rua 28 de Julho, conhecida por Filial da Maroca, onde se impôs como rainha absoluta do meretrício maranhense.
Quando maior era o domínio e a fama de Maroca, irrompe em São Luis, em janeiro de 1951, um movimento político e popular contra aposse de Eugênio Barros no governo do Estado. As lideranças oposicionistas, pensando na possibilidade de intervenção federal no Maranhão, decretam uma greve geral, levando o setor público e privado à paralisação de suas atividades.
Em solidariedade ao movimento das Oposições Coligadas, as mulheres das ruas 28 de Julho e da Palma, fecharam as pernas durante bom tempo. Só voltaram à atividade sexual depois que as lideranças oposicionistas deram o sinal verde. Como tinha amigos contra e a favor do governo, Maroca, não entrou de cabeça na greve, mas, por trás dos panos, incentivou as suas hóspedes ao jejum sexual até ser encontrada uma solução para o impasse político.
Se as prostitutas da Zona do Meretrício de São Luis, lideradas por Maroca, fizeram uma greve sexual, de conotação política, as marafonas de Ilhéus, sob o comando de Maria Machadão, fecharam as portas do Bataclan, em protesto contra a intolerância das dondocas baianas. O que comprova a máxima de que a arte imita a vida e a ficção tem muito a ver com a realidade.

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